Revista da EMERJ - V. 22 - N.3 - Setembro/Dezembro - 2020
R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 22, n. 3, p. 286-310, Setembro-Dezembro. 2020 297 III - A FUNÇÃO REGULATÓRIA DO ESTADO E SUA INTER- FACE COM OS TRIBUNAIS DE CONTAS Não há discussão relevante sobre a possibilidade de os Tribunais de Contas exercerem suas competências constitucio- nais sobre as atividades-meio das agências reguladoras, assim compreendidas suas atividades administrativas rotineiras e ordinárias, tais como a realização de concurso público e todos os demais atos para administração do seu quadro de pessoal, as contratações para compras e serviços necessários a suprir suas necessidades internas, dentre outros tantos. Aplicam-se, sem exceção, todas as regras do artigo 71 da CRFB/88 e, ago- ra, a literalidade do artigo 14 da Lei Federal nº 13.848/2019. Tormentoso, porém, apresenta-se o debate a propósito do controle externo das atividades finalísticas das agências pelas Cortes de Contas, notadamente no que respeita à prática de atos regulatórios executivos, normativos e judicantes, a des- peito de serem atos administrativos em sua essência 8 . Muitos são os fundamentos para a resistência: i) impossibilidade de o controle externo invadir mérito administrativo; ii) impos- sibilidade de a atuação técnica das agências reguladoras ser substituída pela atuação técnica dos servidores dos Tribunais de Contas; iii) sobreposição de funções, permitindo-se a subs- tituição da atuação técnica das agências pelo entendimento técnico-político das Cortes de controle; e iv) ausência de pre- visão constitucional explícita a possibilitar o controle finalísti- co das agências pelos Tribunais de Contas, o que configuraria violação ao princípio da separação de poderes 9 . 8 Esta a posição que tenho sustentado: WILLEMAN, Flávio de Araújo. Responsabilidade Civil das Agências Reguladoras. 3ª edição. Belo Horizonte: Fórum, 2015. 9 Esse entendimento restritivo das competências dos Tribunais de Contas é defendido por Marcos Juruena Vilella Souto (VILELLA SOUTO, Marcos Juruena. Direito Administrativo Regulatório . Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2002. p. 370) e Marçal Justen Filho (JUSTEN FILHO, Marçal. O Direito das Agências Reguladoras Inde- pendentes . São Paulo: Dialética, 2002. p. 588-589). A essa mesma conclusão chegou Luís Roberto Barroso ao proferir, na qualidade de Procurador do Estado do Rio de Janeiro, o Parecer nº 05/98 – LRB, no qual afirma: “Este, portanto, o limite da ingerência do Tribunal de Contas. Nada, rigorosamente nada, no texto constitu- cional o autoriza a investigar o mérito das decisões administrativas de uma autarquia, menos ainda de uma autarquia com característica especial de uma agência reguladora. Não pode o Tribunal de Contas procurar substituir-se ao administrador competente no espaço que a ele é reservado pela Constituição e pelas leis. O abuso é patente.Aliás, nemmesmo o Poder Legislativo, órgão que é coadjuvado pelo Tribunal de Contas no desempenho do controle externo, poderia praticar atos dessa natureza.”
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