Revista da EMERJ - V. 22 - N.2 - Maio/Agosto - 2020
R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 22, n. 2, p. 221 - 248, Maio-Agosto. 2020 237 criminal. A lei de talião foi adotada no Código de Ha- murabi (Babilônia), no Êxodo (hebreus) e na Lei das XII Tábuas (romanos). (…) Finalmente, superando as fases da vingança divina e da vingança privada, chegou-se à vingança pública. Nesta fase, o objetivo da repressão criminal é a segurança do soberano ou monarca pela sanção penal, que mantém as características da cruel- dade e da severidade, com o mesmo objetivo intimida- tório. (…) De qualquer sorte, em nenhuma dessas fases de vingança houve a liberação total do caráter místico ou religioso da sanção penal, tampouco se conheceu a responsabilidade penal individual, que somente a par- tir das conquistas do Iluminismo passou a integrar os mandamentos mais caros do Direito Penal. O uso de algemas para os réus presos no transcurso do jul- gamento, ainda que na Antiguidade clássica fossem mais céleres que a prática forense atual, já denunciava o abuso inquisitivo e estigmatizante do referido artefato. Com especial interesse a par- tir da Idade Média, período histórico em que o direito germânico mesclou-se às instituições romanas e canônicas da nascente igre- ja cristã romana, o agrilhoamento e a adoção das algemas muçul- manas, mais funcionais e menos custosas para fabricação (então em escala artesanal), passam a ser procedimentos hodiernos de apresentação de réus encarcerados para julgamento, havendo apenas a experiência helênica, mormente ateniense, no que con- cerne ao julgamento por tribunal popular – sendo ainda mais comum o modelo presidencialista de juízo singular, baseado na prática franco-germânica. Outrossim, o próprio encarceramento decorrente da pena de prisão, da qual o uso de algemas pode ser considerado maior símbolo, apresenta cerceamento do direito de liberdade ambulatorial comparável a forma de tortura, ainda que aparen- temente branda. Nesse sentido, a pena de prisão pode ser con- siderada uma evolução das penas corporais de outrora. Assim opina o professor e sociólogo francês Michel Foucault sobre a superação dos suplícios corporais em favor da pena de prisão,
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