Revista da EMERJ - V. 22 - N.2 - Maio/Agosto - 2020
R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 22, n. 2, p. 221 - 248, Maio-Agosto. 2020 233 Sustenta-se no presente estudo que a aplicação das algemas como elemento de convicção negativa para os julgadores leigos é intensificada pela manipulação midiática de tal objeto como símbolo do cárcere, de um prejulgamento ao acusado que ainda não teve sequer sua culpa formada após trânsito em julgado da sentença penal condenatória 4 . Ademais, embora a doutrina nacional sustente que o pro- cesso penal brasileiro é informado pelo modelo acusatório, de rígida separação entre as funções de investigar, denunciar, jul- gar e executar a pena – e de fato verifique-se esse fenômeno na formalidade dos atos de persecução penal, com a existência de órgãos autônomos de Polícia Judiciária, Ministério Público e juí- zes destacados para a fase de conhecimento e de execução penal –, a prática também demonstra que diversos postulados típicos do modelo acusatório de processo penal são olvidados no trans- curso da fase cognitiva, especialmente quanto à separação que deveria existir entre as ilações contidas no relatório do inquérito policial e a fundamentação das sentenças penais condenatórias em primeiro grau de jurisdição. Apenas o fato de os autos de inquérito policial fazerem parte integrante e plenamente acessível dos autos processuais já demonstra a fragilidade do modelo acusatório praticado no Brasil, na medida em que caberia ao Ministério Público, em sua denúncia, reproduzir fielmente o disposto no relatório de inquérito policial, sendo este dispensável segundo remansoso entendimento pretoriano. Na investigação de crimes dolosos contra a vida, em que por vezes há maior exposição midiática, a cautela por parte do juiz togado presidente e dos julgadores leigos membros do con- selho de sentença deveria ser ainda maior em não se permitirem 4 Nada obstante, o e. STF formou precedente, em 2016, sobre a possibilidade de cumprimento provisório da pena após sentença penal condenatória em segundo grau de jurisdição, nos termos do julgamento do Habeas Corpus n. 126.292 (rel. min. Teori Zavascki). Sustenta-se neste estudo que tal entendimento, data venia , encontra-se inadequado dada a redação do art. 5º, LVII, da Constituição Brasileira de 1988, que atende aos princípios estabelecidos em tratados internacionais de direitos humanos incorporados ao ordenamento jurídico pátrio, tais como a Convenção Americana de Direitos Humanos de 1969 (Pacto de São José da Costa Rica) – em seu art. 8, item n. 2 – e o Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos de 1966 – em seu art. 14, item n. 2.
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