Revista da EMERJ - V. 22 - N.2 - Maio/Agosto - 2020

 R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 22, n. 2, p. 91 - 150, Maio-Agosto. 2020  133 tentar que, ainda que se aceite que as palavras sejam potencial- mente indeterminadas, existem exemplos paradigmáticos que mostram acordos sobre a sua aplicação em diversos casos. 124 Sus- tentar essa visão não parece ser uma tarefa tão complicada. Ordi- nariamente recorremos a exemplos considerados claros para de- finir o sentido de certos conceitos, ainda que possamos admitir diferenças entre os objetos por eles designados. Assim, ainda que haja diferenças substantivas entre xadrez, futebol e paciência, não há dúvidas relevantes entre falantes da língua portuguesa que os três são espécies de “jogos”. 125 E isso independentemente de qualquer atividade interpretativa. Ao contrário. Quando al- guém, sob circunstâncias normais, não reconhece ou questiona a aplicabilidade da palavra “jogo” a esses casos ou a quaisquer outros considerados exemplos-padrão, dizemos que esta pessoa não domina o uso do conceito. 126 E, por mais que seja possível atribuir a conceitos patologias como a textura aberta da lingua- gem e a eles relacionar a derrotabilidade como característica in- superável, esses não parecem ser traços que sejam capazes de eliminar a existência de amplos acordos sobre a aplicabilidade clara de conceitos e, para o que é central nesta objeção, das regras que deles se servem para a formulação de suas prescrições em algumas situações. Ao contrário do que parece supor Perlingieri, compreender o que exige uma disposição legislativa não depende necessaria- mente de algum esforço interpretativo. Desvincular “compreen- der” de “interpretar” é importante para se sustentar a possibilida- de de haver fidelidade ao direito apenas com base no que as regras, por meio das suas palavras, dizem – e esta é a chave para que as disposições legislativas sejam capazes de vincular e, dessa forma, limitar a atividade judicial. No limite, entender que compreender não depende necessariamente de interpretar é o que permite reco- nhecer quando alguém está, de fato, seguindo uma regra. 124 Sobre esta interpretação do que Hart pretende quando diferencia casos centrais de casos de penumbra relacionados a conceitos, v. MARMOR, Andrei. Interpretation and legal theory . 2 ed. Oxford e Portland: Hart, 2005, p. 102. 125 O exemplo é de MARMOR. Cf. Interpretation and legal theory , op. cit., p. 102. 126 MARMOR, Interpretation and legal theory , op. cit., p. 103.

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