Revista da EMERJ - V. 22 - N.2 - Maio/Agosto - 2020
R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 22, n. 2, p. 91 - 150, Maio-Agosto. 2020 107 – tarefa, até o ponto em que as minhas pesquisas avançaram, não cumprida pelo direito civil constitucional brasileiro 38 – contribui apenas para um aumento incontrolável das variáveis decisórias que precisam ser levadas em consideração em cada caso. Em suas melhores luzes, o que o modelo decisório par- ticularista do direito civil constitucional sugere é que um sem número de razões normativas seja permanentemente levado a sério na solução de cada problema pontual: as regras infraconsti- tucionais incidentes, suas justificações subjacentes, os princípios que justificam a importância de seguir regras e todos os demais princípios constitucionais relevantes aplicáveis, que nem sempre convergirão para um único resultado, para a construção da me- lhor resposta constitucional para o caso. Semmétodos de decisão capazes de controlar racionalmente a manipulação de tantas va- riáveis – se é que tais métodos são possíveis –, o principal risco do amplo endosso desse modelo normativo de tomada de de- cisão é o da transformação de toda e qualquer questão privada controvertida em um caso difícil. 39 Isso porque, dado o conjunto de razões que precisa ser considerado, padrões autoritativos de decisão preexistentes à solução do caso (basicamente regras e precedentes) não serão considerados suficientes, por si sós, mes- mo quando claros, para fornecer respostas para casos concretos (já que existe um dever permanente de conformidade constitu- cional 40 ). Além disso, muito provavelmente haverá razões favo- ráveis e contrárias a qualquer solução sob consideração. Não é surpreendente, neste ponto, notar que essa seja a característica 38 Igualmente possível seria o fornecimento de uma teoria moral holista capaz de justificar por que as partes envolvidas em um caso concreto teriam o direito a obter sempre as melhores respostas para os seus problemas, consideradas todas as circunstâncias e independentemente da presença de padrões autoritati- vos especificamente aplicáveis ao caso. 39 Sobre como as relações entre particularismo e escaldas de justificação até a Constituição podem contri- buir para o aumento de casos difíceis, v. LEAL, Fernando. Todos os casos jurídicos são difíceis? Sobre as relações entre efetividade, estabilidade e teorias da decisão constitucional. Revista de Direito do Estado , 16, p. 87-116, 2009. 40 Mesmo em casos de oferecimento da solução oferecida pela regra, o dever de conformidade constitu- cional não permitirá que se compreenda que a solução do caso foi determinada pela regra. Ao contrário, se o referido dever exige prévia consideração de princípios constitucionais no caso, a “aplicação” da regra pode ser lida, na verdade, como o resultado da simples constatação de que as normas constitucionais con- sideradas pelo tomador de decisão fornecem a mesma resposta que a regra pensada pelo legislador. Nesse quadro, não é o texto das regras que “faz o trabalho”, mas o resultado da grande “ponderação” realizada pelo juiz após a consideração de todas as variáveis anteriormente indicadas.
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