Revista da EMERJ - V. 22 - N.1 - Janeiro/Março - 2020
R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 22, n. 1, p. 284 - 317, Janeiro-Março. 2020 312 No caso da pandemia, esse requisito parece ser o menos polê- mico, pois, antes do início deste ano, ninguém poderia antever a tragédia que hoje assola todo o mundo. O requisito para a aplicação da teoria da onerosidade ex- cessiva mais controvertido na doutrina é certamente a existência de “ extrema vantagem para a outra ” parte. Corrente significativa da doutrina considera que tal exigência é equivocada, pois nada justificaria obrigar um contratante a prosseguir na execução de um contrato ruinoso para ele, apenas porque a outra parte não obteve vantagens desmesuradas. “ Exigir que a alteração das cir- cunstâncias atinja apenas uma das partes em benefício da outras impli- ca em esvaziar significativamente este modelo jurídico, vedando ao con- tratante fragilizado, por acontecimento superveniente extraordinário e imprevisível, o recurso ao remédio resolutório, apenas por não provar o enriquecimento sem causa provado pelo parceiro contratual .” 74 Muito se discutiu acerca dos efeitos decorrentes da aplica- ção do art. 478 do Código Civil, uma vez que a literalidade da norma impediria a revisão dos contratos, possibilitando apenas a resolução deles. Isso porque a norma estipula que a parte poderá “ pedir a resolução do contrato ”. Além disso, o art. 479 do Código Civil permite que a revisão ocorra, mas somente se a outra parte, desejosa de manter vivo o negócio, se disponha a concedê-la. Após acesos debates na doutrina, com posicionamentos pró 75 74 CRISTIANO CHAVES DE FARIAS e NELSON ROSENVALD, “Curso de Direito Civil”, vol. 4, 5ª edição, Atlas, São Paulo, 2015, p. 564. 75 FABIO ULHOA COELHO defendendo a possibilidade de revisão do contrato por considerar ser a melhor solução em termos práticos, afirmando que “ Tem-se entendido, porém, que a estreiteza do di- tame legal não basta para excluir a revisão judicial do contrato, quando fora esta a pretensão do contratante surpreendido pelas mudanças nas condições econômicas. A parte com dificuldades para cumprir a obrigação considerada excessivamente onerosa pode optar pela revisão judicial do contrato. Se suas cláusulas puderem ser equitativamente redefinidas pelo juiz, isso tende a ser melhor e mais eficiente para os dois contratantes. A resolução só deve ser decretada se a revisão não se mostrar capaz de restaurar a justa distribuição de proveitos entre eles” (“Curso de Direito Civil”, volume 3, Saraiva, São Paulo, 2005, p. 105/106.. Na mesma linha, ANTÔNIO JEOVÁ SANTOS afirma que a revisão não é só possível, como também é a melhor solução na maioria dos casos concretos, afinal “ O prejudicado é senhor de sua vontade, pois pode pedir a resolução ou a revisão do contrato, segundo o que entenda melhor convenha a seus interesses pessoais e econômicos. A revisão oferece maior possibilidade de solução, tomando como base a justiça contratual, a equidade sobretudo, a gama de dificuldades que são despejadas pela excessiva onerosidade ” (“Função Social, lesão e onerosidade excessiva nos contratos”, Método, São Paulo, 2002, p. 252/253). Outros doutrinadores, levando em considera- ção a firmeza quase inflexível do texto do art. 478 do Código Civil, tentam justificar a possibilidade da revisão do contrato com base no art. 317 daquele mesmo diploma, que segundo eles possibilitaria a almejada revisão. Neste sentido, é a lição de RUY ROSADO DEAGUIAR, que considera que o art. 478 diria respeito única e exclusivamente à resolução, sendo que a revisão dos contratos seria permitida
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