Revista da EMERJ - V. 22 - N.1 - Janeiro/Março - 2020
R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 22, n. 1, p. 284 - 317, Janeiro-Março. 2020 301 A delimitação dos riscos fixadas pela lei pode atingir inclu- sive eventos de caso fortuito e força maior, determinando o or- denamento jurídico que certas pessoas em situações específicas são obrigadas a suportar até mesmo as consequências de fatos externos, inevitáveis e imprevisíveis. O art. 399 do Código Civil é o exemplo mais claro ao definir que “ [o] devedor em mora responde pela impossibilidade da prestação, embora essa impossibilidade resulte de caso fortuito ou de força maior, se estes ocorrerem durante o atraso (...)” 43 A lei ainda aponta hipótese em que a alocação de risco por ela definida pode ser modificada pela vontade das partes, como se dá no art. 448 do Código Civil, que faculta às partes, “ por cláusula expressa, reforçar diminuir ou excluir a responsabilidade pela evicção ”. Ou ainda no art. 698 do Código Civil, que permite a inclusão da cláusula del credere levando a assunção dos risco do comissário de responder “ solidariamente com as pessoas que houver tratado em nome do comitente ”. Entretanto, a hipótese mais importante – pelo menos para o presente debate – de possibilidade de mudança da alocação de risco legalmente fixada é o próprio art. 393 do Código Civil, que permite “à s partes convencionem o deslocamento do risco do fortuito em favor do credor, fazendo com que persista a responsabilidade do de- vedor, mesmo se a inexecução se der em decorrência de evento inevitável para o qual este não tenha ocorrido ” 44 . Na verdade, as cláusulas de alocação de risco são comuns. Bastando lembrar as tradicionalíssimas cláusulas penais, de não indenizar e de limite de indenização. Mas as cláusulas de aloca- ção de risco não se limitam à exclusão ou à limitação de perdas e danos. Podem regular diversos outros aspectos, como se dá na 43 Existem diversos outros casos em que o ordenamento impõe a uma parte que se encontra em deter- minada situação a necessidade de arcar com os riscos do caso fortuito e da força maior, como é a hipóte- se daquele que substabeleceu o mandato sem poderes para tanto, na forma do art. 667, § 1º, do Código Civil, segundo o qual “Se, não obstante proibição do mandante, o mandatário se fizer substituir na execução do mandato, responderá ao seu constituinte pelos prejuízos ocorridos sob a gerência do substituto, embora provenien- tes de caso fortuito, salvo provando que o caso teria sobrevindo, ainda que não tivesse havido substabelecimento” . Situação idêntica é fixada pela lei para o gestor de negócio que iniciou a gestão contra a vontade ma- nifesta ou presumível do interessado (CC., art. 862). Também o possuidor que má-fé, na forma do art. 1.218, “(...) responde pela perda, ou deterioração da coisa, ainda que acidentais (...)”. 44 GUSTAVO TEPEDINO, HELOISA HELENA BARBOSA e MARIA CELINA BODIN DE MORAES, “Código Civil Interpretado Conforme a Constituição da República”, vol. I, 2ª edição, Renovar, Rio de Janeiro, 2007, p. 712.
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