Revista da EMERJ - V. 22 - N.1 - Janeiro/Março - 2020

 R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 22, n. 1, p. 284 - 317, Janeiro-Março. 2020  300 (e) A alocação dos riscos do contrato “O regime da impossibilidade tem, subjacente, as regras sobre repartição dos riscos, nas obrigações” 41 Toda a discussão em torno da impossibilidade do cumpri- mento das obrigações e acerca do caso fortuito e da força maior está intimamente ligada à alocação de riscos dos contratos, que nada mais é do que a escolha dos contratantes sobre os riscos que eles aceitaram correr ao celebrar o contrato e aqueles outros que eles repudiaram. Ao celebrar todo e qualquer contrato, por mais singelo que seja, o contratante assume riscos e, ao definir o conteúdo do con- trato, no exercício da autonomia de sua vontade, delimita quais pretende assumir. É imperioso notar que a autonomia da vontade não é so- berana em todas as situações de alocação de riscos. Há hipóteses em que o ordenamento jurídico delimita os riscos de forma obri- gatória, levando em consideração o tipo contratual. Veja-se, por exemplo, que o art. 735 do Código Civil impõe ao transportador todos os riscos pelos fatos de terceiros, equi- paráveis a fortuito interno, não sendo sequer válida cláusula de exoneração dessa responsabilidade 42 . De forma semelhante, o art. 618 do Código Civil aloca na álea do construtor os vícios de construção ocorridos no prazo irredutível de garantia nele fixa- do. Ainda no contrato de empreitada, a lei impõe ao empreiteiro (CC, art. 620) os riscos atinentes à flutuação do preço dos insu- mos ao permitir apenas a redução do preço global na hipótese de diminuição do custo deles, sem facultar, no entanto, que o incremento dos preços possa ser repassado ao dono da obra. Na mesma linha responde o depositário pelos danos causados à coi- sa depositada, salvo fortuito e força maior (CC., art. 642), sem que possa ser contratualmente pactuado de outra forma. 41 MENEZES CORDEIRO, “Tratado de Direito Português”, vol. II, T. IV, Almedina, Coimbra, 2010, p. 186. 42 Veja-se que a proibição da cláusula de não indenizar e de limitação de responsabilidade são proi- bidas pela parte final do art. 734 do Código Civil e pela Súmula 161 do Supremo Tribunal Federal.

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