Revista da EMERJ - V. 22 - N.1 - Janeiro/Março - 2020
R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 22, n. 1, p. 284 - 317, Janeiro-Março. 2020 299 (d) A impossibilidade parcial A impossibilidade poderá ainda ser parcial, pois “ pode atingir uma parte apenas da prestação, se a destruição afectou só uma parte da coi- sa (divisível) ou algumas das várias coisas (cumulativamente) devidas ”. 37 A impossibilidade parcial atrairá a regra do art. 184 do Có- digo Civil 38 , que consagra o princípio da conservação do con- trato, com a aplicação do brocardo utile per inutile non vitiatur, permitindo a redução do negócio jurídico. Ou seja, a parte atin- gida pela impossibilidade será suspensa (impossibilidade tem- porária) ou perecerá (impossibilidade definitiva), permanecendo válidas as demais partes, desde que separáveis. A aplicação da regra depende de três requisitos. (i) É neces- sário que existam prestações que possam ser separadas de modo que a impossibilidade venha a atingir apenas uma parte delas, deixando as demais intactas. (ii) É imperioso que a parte afeta- da não seja considerada como “ ponto fundamental ” 39 do negócio, que é aquele que, por força do ordenamento jurídico, não pode ser desconsiderado sem inviabilizar o negócio jurídico, porque caracteriza a sua essência ( essentialia negotti ), ou descaracterizá- -lo, pois resulta da natureza do tipo eleito ( naturalia negotti ). (iii) É impositivo, ainda, que a impossibilidade parcial não contrarie as justas expectativas das partes, objetivamente consideradas, como ordena a parte inicial da norma ao apontar a necessidade de respeito à “ intenção das partes ” 40 . Ou seja, os elementos particulares ( accidentalia negotti ), quando fundamentais à manutenção do plano contratual traça- do pelas partes, devem ser respeitados para viabilizar a redução a que alude o art. 184 do Código Civil. 37 ANTUNES VARELLA, Ob. cit.; p. 740. 38 O dispositivo legal possuía a seguinte redação “Respeitada a intenção das partes, a invalidade parcial de um negócio jurídico não o prejudicará na parte válida, se esta fora separável, a invalidade da obri- gação principal implica a das obrigações acessórias, mas a dessa não induz a da obrigação principal”. 39 Cf. CAIO MARIO DA SILVA PEREIRA, “Instituições de Direito Civil”, vol. I, 12ª edição, Forense, Rio de Janeiro, 1991, p. 444. 40 “ A inseparabilidade resulta da natureza do negócio jurídico ou do ato jurídico stricto sensu , ou da subordi- nação do todo à parte nula, no caso de saberem os que manifestaram a vontade, ou de o saber o que a manifestou, que seria nula a parte, Isto é: qual teria sido a conduta deles ou dele, quanto ao resto. Certo, quem quis o ato jurídico o quis todo, mas as circunstâncias podem mostrar que se quis resto, ainda sem a parte ” (PONTES DE MIRANDA, Tratado de Direito Privado, Tomo IV, 2ª edição, Borsoi, Rio de Janeiro, 1954, p. 51)
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