Revista da EMERJ - V. 22 - N.1 - Janeiro/Março - 2020
R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 22, n. 1, p. 284 - 317, Janeiro-Março. 2020 289 que, em princípio, incumbe àquele que postula o efeito liberató- rio 7 , a obrigação deverá ser cumprida. Saliente-se, ainda, que, mesmo caracterizado o caso fortui- to e a força maior capazes de gerar entraves ao cumprimento da obrigação, levando à aplicação do art. 393 do Código Civil, seu efeito poderá ser (aliás, na maioria dos casos será) restrito. A consequência direta da aplicação da referida norma legal se limita a impedir que o devedor responda pelos efeitos da mora (ou inadimplemento) 8 . Em princípio 9 , mormente no que concer- ne aos casos de impossibilidade temporária, não será afetada a obrigação originária e principal que deixou de ser cumprida no tempo, no lugar e na forma adrede estabelecidas. “ O efeito mais marcante da força maior é o de fazer desparecer a responsabilidade do devedor no caso de inexecução de sua obrigação. É uma causa de libera- ção ou de exoneração da responsabilidade ” 10 . Aliás, essa consequência pode ser extraída diretamen- te do texto legal que aponta com precisão que “ O devedor não responde pelos prejuízos resultantes de caso fortuito ou força maior (...) ”. A regra não ataca a higidez da obrigação. Apenas impede o nascimento da obrigação secundária de indenizar te’, de maneira que o fato será ou não ‘necessário’, caracterizando o fortuito ou força maior, conforme a concreta situação em que verificado, a possibilidade de conhecimento do fato pelo agente, usando normal diligência, e a sua impossibilidade de resistir ao evento, ou de eliminá-lo (ou de resistir ou eliminar as suas consequ ências) relativamente ao dever a ser prestado. Deve ser igualmente considerado o tipo de atividade desen- volvida pelo devedor, a qualidade dos sujeitos envolvidos, a extensão dos seus deveres de garantia, custódia, conservação, segurança, controle, etc., e, principalmente, a cláusula geral da boa-fé ( art. 422), a qual exige que o limite da responsabilidade do devedor seja avaliado em referência ao inteiro conte- údo da relação obrigacional. » (“Comentários ao Código Civil”, volume V, tomo I, Ed. Forense, p. 200) 7 Vale aqui lembrar-se do art. 373 do Código de Processo Civil que, em regra, aponta como ônus do autor a prova dos fatos constitutivos de seu pedido (inciso I); e ao réu o ônus de comprovar os fatos impeditivo, modificativo do direito do autor. Deve ser lembrado que a regra geral pode ser alterada pela aplicação da teoria da carga dinâmica da prova (CPC, art. 373, § 1º), pela convenção das partes (CPC, art. 373, § 3º) ou pela inversão do ônus da prova (CDC, art. 6º, VIII). 8 Perdas e danos no caso da mora; e a resolução do contrato, acrescida ou não, conforme o caso, de perdas e danos, na hipótese de inadimplemento. 9 Existirão algumas hipóteses em que as circunstâncias levarão não só à exoneração dos efeitos da mora ou do inadimplemento, mas atingirá as obrigações, como, por exemplo, naquelas situações em que o obstá- culo, por sua gravidade ou pelo seu tempo de duração, for capaz de gerar a impossibilidade definitiva do cumprimento da obrigação ou a perda do interesse do credor, objetivamente considerada. 10 CHRISTIAN LARROUMET (“Droit Civil – Les Obligations, Le Contrat”, Tome III, 5 eme ed., Econo- mica, Paris, 2003, p. 841) (tradução livre; no original: “L’effet le plus remarquable de la force majeure est de faire disparaître la responsabilité du débiteur en cas d’inexécution de son obligation. C’est une cause de libération ou d’exonération de la responsabilité”.)
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