Revista da EMERJ - V. 21 - N. 3 - Setembro/Dezembro - 2019 - Tomo 2
389 R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 21, n. 3, t. 2, p. 374-393, set.-dez., 2019 TOMO 2 premo Tribunal Federal 31 , sob a relatoria final da Ministra Rosa Weber. Em síntese apertada, a Suprema Corte entendeu que não houve invasão da com- petência legislativa ante ao fato de que o artigo 68 do ADCT possui eficácia plena e, portanto, não seria o caso de um decreto autônomo proibido. Também restou reconhecida a validade da utilização do critério da autoidentificação, sendo correta a abertura da Constituição para outros saberes advindos da Antropologia contemporânea e que fora adotado na Convenção 169 da OIT. Assentou-se, outrossim, a possibilidade de ser levado em consideração, para fins de medição e demarcação das terras, os critérios de territorialidade indicados pelos remanescentes das comunida- des dos quilombos e, por fim, a adequação do instrumento da desapro- priação para imóveis que estejam sob domínio registral particular. 4. CASOS DOS QUILOMBOS DO LEBLON, ILHA DE MARAM- BAIA, CHICO REI E COMUNIDADE NEGRA RURAL PACOVAL Os quatro exemplos aqui citados são importantes para indiciar o convencimento de que, inelutavelmente, houve uma forma genérica de formação dos quilombos vinculada à fuga para esconderijos na mata, cuja representatividade maior é a do notório Quilombo dos Palmares, mas a formação desses agrupamentos quilombolas que restaram e permanecem nos dias que correm não possuem homogeneidade no tocante ao modo de constituição, merecendo estudo casuístico para a sua configuração que deverá se iniciar a partir da autoatribuição da comunidade. O Quilombo do Leblon 32 , nome que deu origem ao bairro, se es- truturou a partir da iniciativa de José de Seixas Magalhães, que adquiriu 31 Decisão: Preliminarmente, o Tribunal, por maioria, conheceu da ação direta, vencidos os Ministros Marco Aurélio e Ricardo Lewandowski. No mérito, o Tribunal, por maioria e nos termos do voto da Ministra Rosa Weber, que redigirá o acórdão, julgou improcedentes os pedidos, vencidos o Ministro Cezar Peluso (Relator), e, em parte, os Ministros Dias Toffoli e Gilmar Mendes. Votaram, no mérito, os Ministros Marco Aurélio e Ricardo Lewandowski. Não votou o Mi- nistro Alexandre de Moraes, por suceder o Ministro Teori Zavascki, que sucedera o Ministro Cezar Peluso. Presidiu o julgamento a Ministra Cármen Lúcia. Plenário, 8.2.2018. (Disponível em: <http://portal.stf.jus.br/processos/detalhe. asp?incidente=2227157 > . Acesso em: 19 out. 2018) 32 No romance “A Conquista”, obra literária de Coelho Netto, lançada pela primeira vez em 1899, o autor se vale de um personagem fictício chamado “Anselmo Ribas” para contar a história do movimento abolicionista que vivenciara na cidade do Rio de Janeiro, citando inclusive personagens reais como, por exemplo, José do Patrocínio. Em determinado momento, é narrado pelo autor a existência de um quilombo na Gávea, como era conhecido a região que hoje chamamos de Leblon: “Justamente nesse tempo a campanha abolicionista chegara à sua maior intensidade. À luz do sol, nas ruas concitava-se à revolta. Para os lados da Gávea havia um quilombo mantido pela Confederação Abolicionista, e no escri- tório da Gazeta da Tarde, negros e negras, sentados, melancolicamente, fumavam esperando que lhes dessem destino.” (NETTO, Coelho. A Conquista . Rio de Janeiro: Ebal, 1957, p. 27).
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