Revista da EMERJ - V. 21 - N. 3 - Setembro/Dezembro - 2019 - Tomo 2
383 R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 21, n. 3, t. 2, p. 374-393, set.-dez., 2019 TOMO 2 Por essa diretriz de atuação, os quilombos hoje não devem ser re- conhecidos a partir de um estudo meramente arqueológico, com vistas ao passado, ou de vínculos de hereditariedade, mas sim de um agrupamento humano que conta com um referencial de ancestralidade negra que pode até mesmo ter se aquilombado não por fuga, mas por outros fatores como com o próprio apoio e consentimento da sociedade que compunha o Es- tado escravocrata, o que parece convencer que não há uma homogeneida- de de situações formadoras dos quilombos. No Direito Internacional, o critério da autoatribuição foi presti- giado pela já referida Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho, que trata dos direitos dos povos Indígenas e Tribais, aprovada em Genebra, em 27 de junho de 1989, a qual adentrou no regime jurídico brasileiro por intermédio do Decreto Federal nº 5.051/04 20 , merecendo relevo que o citado ato normativo tem por objeto a proteção de direitos humanos e mesmo não emendando a Constituição, tem força de norma jurídica supralegal. Nesse passo, importa trazer à consideração o ensina- mento de Flávia Piovesan, quando diz que os tratados de direitos huma- nos vêm “aprimorar e fortalecer, nunca restringir ou debilitar, o grau de proteção dos direitos consagrados no plano normativo interno. 21 ” Em tal regramento é possível verificar que, dentre os princípios de política geral para a aplicação da legislação, encontra-se a autoidentificação, quando se que diz “a consciência de sua identidade indígena ou tribal deverá ser considerada como critério fundamental para determinar os grupos aos que se aplicam as disposições da presente Convenção.” (art. 1º, item 2). Após vincular o acerto do critério da autodefinição à Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho, o professor Shiraishi Neto destaca que essa ressignificação dos quilombos aqui discutida está ligada ao direito dado ao sujeito de ter a consciência de si mesmo e sobre qual grupo pertence. Das suas lições extrai-se: A consciência de sua identidade indígena ou tribal deverá ser considerada como critério fundamental para determinar os gru- pos aos que se aplicam as disposições da presente Convenção 20 BRASIL. Decreto n. 5.051, de 19 de abril de 2004. Promulga a Convenção no 169 da Organização Internacional do Trabalho - OIT sobre Povos Indígenas e Tribais. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004- 2006/2004/decreto/d5051.htm > . Acesso em: 18 out. 2018. 21 PIOVESAN, Flávia. Direitos Humanos e o Direito Constitucional Internacional . 18. ed. São Paulo: Saraiva, 2018, p. 193.
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