Revista da EMERJ - V. 21 - N. 3 - Setembro/Dezembro - 2019 - Tomo 2
R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 21, n. 3, t. 2, p. 364-373, set.-dez., 2019 366 TOMO 2 da sociedade industrializada, que obriga a um perigoso contato físico, o que dificulta o isolamento moral (AULETTA, 1978, p.1). Além disso, enquanto na sociedade rural só havia um ambiente so- cial, onde a pessoa exauria toda a sua vida, a evolução e a sofisticação da sociedade industrializada passaram a favorecer uma multiplicação de am- bientes sociais: o ambiente do trabalho, do clube, da família, do curso, da academia, etc. A variedade dos ambientes legitima a pretensão de a pessoa controlar as informações referentes a si própria, de modo a filtrá-la e a evitar que determinados aspectos de sua personalidade, embora conhe- cidos em um determinado ambiente, não o sejam em outros ambientes onde possivelmente não seriam aceitos. Tal problema não se punha em uma sociedade rural em cujo ambiente único toda a vida se desenvolvia e que provocava a resignação das pessoas a uma situação de discriminação originada em um modo de vida disforme do padrão social. A revolução tecnológica da comunicação subverte essa lógica. A multiplicidade de meios de comunicação ao alcance de um simples toque de um dedo, o anseio moderno por reconhecimento social, a preocupa- ção de divulgar a própria imagem de uma maneira socialmente positiva, têm como consequência a redução voluntária da esfera da intimidade. Por outro lado, a curiosidade pública tende a invadir mesmo uma esfera mais recôndita, na busca incessante e insaciável de revelações sobre a intimidade do outro, ainda mais se se tratar de pessoa pública. É nesse contexto da revolução tecnológica da comunicação que se inserem os dois casos acima referidos. Caso Moro/MP No caso Moro/Ministério Público, o que se viu foi a interceptação de mensagens trocadas pelo Telegram, realizada por terceiro, que foram publicadas pelo site The Intercept Brasil. O que se pretende destacar neste ar- tigo não é a óbvia e gritante quebra da imparcialidade do então magistrado e sua suspeição 1 , nem aspectos éticos envolvidos, mas a circunstância de se tratar de uma pessoa pública, um agente público, que dirigia um processo 1 Antonio VIEIRA já demonstrou à saciedade a quebra de imparcialidade em casos similares, até mesmo nos EUA: Como a justiça dos EUA tratou casos de troca de mensagens entre juízes e promotores, durante julgamentos criminais (https://www.conjur.com.br/2019-jun-19/antonio-vieira-eua-tratam-contatos-entre-juizes-promotores , publicado em 19/6/2019).
Made with FlippingBook
RkJQdWJsaXNoZXIy NTgyODMz