Revista da EMERJ - V. 21 - N. 3 - Setembro/Dezembro - 2019 - Tomo 2

 R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 21, n. 3, t. 2, p. 596-616, set.-dez., 2019  604 TOMO 2 objeto da entidade: se ela foi constituída para o fim de viabilizar ou cola- borar no exercício das liberdades do espírito de seus membros, a proteção a ela, neste particular, decorre da tutela concedida a eles. Sua situação dife- re muito daquela, e.g. , de sociedades empresárias dedicadas a uma atividade comercial comum ( e.g. , um bar ou uma loja de roupas), cujo adequado de- sempenho é absolutamente desvinculado da convicção de qualquer um de seus integrantes ou colaboradores 28 . Entre esses extremos, é claro, há uma zona cinzenta, em que a determinação do peso da consciência só pode ser aferida diante das características específicas da entidade e das funções que ela efetivamente exerce. Também é necessário colocar a substância acima da forma. Há em- presas desenvolvidas com o instrumental da personalidade jurídica, mas que continuam muito associadas à pessoa ou à intimidade do(s) seu(s) sócio(s) ou empresário(s). Além das empresas individuais, é possível cogi- tar, ainda, de sociedades formadas por familiares próximos e/ou que, de algum modo, envolvam uma grande proximidade com sua vida pessoal. Nessas situações, ou bem a entidade jurídica e a pessoa natural formam uma unidade, porque a atividade é desenvolvida pela segunda; ou bem a empresa se insere no âmbito da intimidade de alguém ou de um grupo. Nas duas situações, não é viável proteger a convicção e a privacidade das pessoas naturais sem estender seus efeitos à esfera da pessoa jurídica. Como a consciência é inerentemente individual, não há como sus- tentar que o status de objetor possa ser concedido a pessoas jurídicas – exceto quando se está diante de entidades expressivas, quando a empresa e a pessoa natural se confundem, ou ainda quando a atividade econômica se insira na intimidade de alguém ou de um círculo privado. No primeiro caso, o cumprimento do dever legal ofenderia a consciência das pessoas (naturais) que integram a instituição, na medida em que contrariaria a pró- 28 Em casos que envolviam vários tipos de discriminação, a Suprema Corte dos EUA considerou válida a aplicação de leis que proibiam essas práticas por parte de sindicatos ( Railway Mail Ass’n v. Corsi , 326 U.S. 88 (1945)), escritórios de advocacia ( Hishon v. King & Spalding , 467 U.S. 69 (1984)) e mesmo associações ( Roberts v. United States Jaycees , 468 U.S. 609 (1984); Bd. of Dirs. of Rotary Int’l v. Rotary Club , 481 U.S. 537 (1987)), tendo vedado, ainda, que subsídios estatais se dirigissem a escolas privadas com políticas de segregação racial ( Norwood v. Harrison , 413 U.S. 455 (1973)). No entanto, quando a entidade é considerada expressiva, sua proteção é maior ( Boy Scouts of America et al. v Dale , 530 U.S. 640 (2000)). A conexão com a finalidade social da entidade é direta: a tutela constitucional depende da demonstração de que a pessoa jurídica não con- seguirá desenvolver seu objeto de forma adequada se atender à medida imposta pelo Poder Público ( New York State Club Ass’n v. New York City , 487 U.S. 1, at 13 (1988)). A contrario sensu , a ausência de qualquer perturbação na capacidade de a entidade expressar seus próprios valores e opiniões demonstra a validade da medida estatal ( Rumsfeld v. Forum for Academic and Institutional Rights, Inc. , 547 U.S. 47 (2005)).

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