Revista da EMERJ - V. 21 - N. 3 - Setembro/Dezembro - 2019 - Tomo 2

 R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 21, n. 3, t. 2, p. 596-616, set.-dez., 2019  600 TOMO 2 Nos termos do art. 5º, VIII, da Carta, eventuais sanções pelo des- cumprimento de um dever por imperativo de consciência só podem ser aplicadas se, cumulativamente: (a) o dever for geral e previsto em lei – em conexão com o art. 5º, II, da Constituição 11 ; (b) houver previsão também em lei de serviço alternativo; (c) este não for incompatível com a convicção do cidadão; e (d) o interessado deixar de prestá-lo (de forma injustificada) 12 . A Carta autoriza, nesses casos, a suspensão dos direitos políticos (art. 15, IV), mas não designa a autoridade competente para tanto – que, no regime anterior, era o Presidente da República 13 . Até a revogação da Lei nº 818/1949, ocorrida em 2017, ainda se previa o decreto presidencial como a via apropriada para isso. No entanto, o silêncio da disciplina nor- mativa implica que a questão deve ser decidida pelo Judiciário 14 . O tema pode ser objeto de nova reflexão na eventualidade de se editar lei em sen- tido diverso. Mas, até que isso venha a ocorrer, não se pode presumir que sanção de tamanha gravidade dependa da vontade de um órgão político- -partidário. Quanto ao período da suspensão, cabe ao legislador fixá-lo em termos razoáveis. As observações acima se aplicam ao serviço militar 15 , “obrigatório nos termos da lei” (CRFB, art. 143, caput ). São dispensados, em tempo de paz, “as mulheres e os eclesiásticos”, que ficam “sujeitos, porém, a outros encargos que a lei lhes atribuir” (CRFB, art. 143, § 2º). Além disso, cabe às 11 Essa conexão é sublinhada por SILVA, José Afonso da. Comentário contextual à Constituição . 7. ed. São Paulo: Malheiros, 2010, p. 99. 12 Destacando que somente o descumprimento da prestação alternativa dá ensejo a sanções, v. SILVA, José Afonso da. Op. cit. , p. 99; MENDES, Gilmar Ferreira. Os direitos políticos na Constituição. In: MENDES, Gilmar Ferreira; BRAN- CO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de Direito Constitucional. 9. ed. São Paulo: Malheiros, 2014, p. 737; NOBRE JÚNIOR, Edilson Pereira. Da perda e suspensão dos direitos políticos. Revista de Informação Legislativa , v. 35, n. 139, pp. 203-216, jul./ set. 1998, p. 214. 13 CF/1969, art. 144, II, b , e § 2º. 14 SILVA, José Afonso da. Op. cit. , p. 236; NOBRE JÚNIOR, Edilson Pereira. Op. cit. , p. 215. 15 Nos planos internacional e supranacional, entendia-se que a objeção de consciência ao serviço militar não tinha fun- damento nos tratados de direitos humanos. Essa orientação era adotada pelo Comitê de Direitos Humanos da ONU ( L.T.K. v. Finland , Communication No. 185/1984, Declared inadmissible on 9 July 1985) e pelas Comissões Interamericana ( Cristián Daniel Sahli Vera y otros v. Chile , Caso 12.219, Informe No. 43/05, Inter-Am. C.H.R., OEA/Ser.L/V/II.124 Doc. 7 (2005)) e Europeia de Direitos Humanos ( e.g. , G. Z. v. Austria , no. 5591/72, Commission decision of 2 April 1973). Mais recentemente, porém, houve uma mudança de interpretação e o referido direito passou a ser reconhecido tanto pelo Comitê da ONU ( General Comment no. 22 , cit., § 11; Id. , Communications Nos. 1853/2008 and 1854/2008, Cenk Atasoy (1853/2008), and Arda Sarkut (1854/2008) v. Turkey , Views adopted on 29 March 2012, § 10.4; Communication Nos. 1321/2004 and 1322/20014, Yeo-Bum Yoon and Mr. Myung-Jin Choi v. Republic of Korea , Views adopted on 3 November 2006; e Communication Nos. 1593 to 1603/2007, Eu-min Jung et al., Views adopted on 23 March 2010) como pela Corte Europeia ( Bayatyan v. Armenia [GC], no. 23459/03, § 110, 7 July 2011).

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