Revista da EMERJ - V. 21 - N. 3 - Setembro/Dezembro - 2019 - Tomo 2

599  R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 21, n. 3, t. 2, p. 596-616, set.-dez., 2019  TOMO 2 2. A objeção de consciência na Constituição de 1988 Todas essas preocupações foram atendidas pela Constituição de 1988 (CRFB), que acolheu a objeção de consciência como um direito fun- damental e admitiu que a lei previsse, para quem a invocar, uma prestação alternativa, compatível com a convicção ética do indivíduo (art. 5º, VIII). Pelas razões acima, a oferta dessa prestação alternativa deixa de ser uma possibilidade para ser um imperativo sempre que, sem ela, a objeção de cons- ciência gerar uma vantagem desmedida para o objetor. A invocação da objeção de consciência exige uma restrição à pri- vacidade: o sujeito deve informar suas convicções para que as autorida- des possam acomodar seu pleito 9 . Na tentativa de diminuir esse custo, há quem sustente que, até certo limite, a prestação alternativa pode ser mais custosa que o dever legal, como forma de evitar um abuso da objeção de consciência, garantindo que só os casos de firme convicção sejam abarca- dos 10 . Essa postura parece adequada como forma de assegurar a preserva- ção da ordem jurídica e evitar fraudes. Em certa medida, é o que se passa com os candidatos sabatistas nos concursos públicos realizados aos sába- dos, quando ficam durante quase todo o dia separados do contato com os demais, para só depois do pôr do sol iniciarem suas provas – garante-se a isonomia entre os candidatos e, ao mesmo tempo, evita-se que aventu- reiros invoquem a objeção de consciência como meio de obter vantagens indevidas. Isso não significa que se devem impor dificuldades desnecessá- rias aos objetores, mas simplesmente que medidas de acomodação podem envolver alguns custos mais elevados para quem invoca a objeção. 9 O fato de a objeção ser um direito não autoriza o interessado a exercê-lo arbitrariamente, por suas próprias mãos. Diante disso, o Superior Tribunal Militar manteve a condenação, por abandono de posto, de um soldado que – tendo afirmado inicialmente não ter religião – simplesmente deixou o serviço sem autorização porque, sendo adventista, não poderia trabalhar aos sábados (STM, DJ 3 abr. 2007, Apelação 2005.01.050146-0/PE, Rel. Min. Gen. Ex. Sergio Ernesto Alves Conforto). 10 RUIZ MIGUEL, Alfonso. Op. cit. , pp. 106-107. Segundo o autor, ao mesmo conduziria a ausência de previsão expressa da objeção na lei penal – a cominação da sanção já serviria como desestímulo a fraudes. No entanto, como alertam Posner e McConnell, o risco a que o sujeito se submete só serve como um indício do grau de restrição que sua liberdade sofre até o efetivo reconhecimento de uma exceção – depois disso, os futuros objetores enfrentam perigos muito menores (se é que enfrentam algum) do que os que se apresentaram os primeiros. V. MCCONNELL, Michael W.; POSNER, Richard A. An economic approach to issues of religious freedom. The University of Chicago Law Review , v. 56, n. 1, pp. 1-60, Winter 1989, p. 52.

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