Revista da EMERJ - V. 21 - N. 3 - Setembro/Dezembro - 2019 - Tomo 2
575 R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 21, n. 3, t. 2, p. 556-595, set.-dez., 2019 TOMO 2 O IRDR reinventado pela Câmara dos Deputados O IRDR representa a possibilidade de acentuada guinada no direito processual civil brasileiro, com potencial de alto impacto nas relações jurí- dicas. É natural, portanto, que seja objeto de intensa discussão doutrinária, que se acirra na fase de deliberação legislativa 53 , quando, a partir do influ- xo das razões públicas e da participação ativa da sociedade 54 , é possível efetivamente promover alterações na estrutura do instituto. Após a aprovação do anteprojeto no Senado, o conjunto das críticas doutrinárias seguiu uma mesma direção, no sentido de censurar o caráter preventivo do incidente e determinar que sua instauração somente pudesse ocorrer em segundo grau de jurisdição. Ausente qualquer requisito objetivo para a admissão do IRDR, os críticos estabeleceram que ele poderia ser admitido sem qualquer amadurecimento da questão de direito em exame, o que levaria a um debate rarefeito e, consequentemente, à fixação de uma tese jurídica pobre, que fadaria o instituto à inutilidade, uma vez que haveria um grande número de decisões cuja discussão ultrapassaria a limitada abrangên- cia jurídica da tese e, por isso, as demandas repetitivas não seriam obstadas. A emenda apresentada pelo deputado Bruno Araújo foi a que mais se deteve na fundamentação. Segundo o parlamentar: “Não se revela adequado prever tal incidente de forma preven- tiva, sob pena de acarretar o risco de não se chegar à melhor solução a ser dada ao caso. Considerada a finalidade de redu- zir o número de causas repetitivas, é razoável dispor que o incidente seja preventivo , mas essa não é a melhor opção para que se tenha uma decisão que firme a melhor solução a ser dada a tais casos.” 53 “A deliberação, nas democracias contemporâneas, deve estar, necessariamente, em ambos os polos – representação e participação – assim como nos canais através dos quais representação e participação se comunicam e interagem. Portanto, não apenas as casas legislativas devem ser instâncias deliberativas, como o que nelas se delibera deve ecoar e reverbe- rar, da melhor forma possível, os processos de deliberação em curso nas instâncias de participação política. Para tanto, requer-se que haja canais permanentes, institucionalizados e deliberativos, que facultem a interação entre as instâncias de representação e de participação política”. ANASTASIA, Fatima; INACIO, Magna. Democracia, Poder Legislativo, interesses e capacidades. Caderno da Associação dos Consultores Legislativos e do Orçamento e Fiscalização Financeira da Câmara dos Deputados, nº 40, maio/agosto de 2010, Brasília, 2010, p. 36. 54 Segundo Canotilho, a democracia discursiva não se assenta “em direitos universais do homem (ou direitos preexistentes na perspectiva liberal) nem na moral social de uma comunidade determinada (como sustenta a visão republicana), mas em regras de discussão, formas de argumentar, institucionalização de processos [...], cujo fim é proporcionar uma solução nacional e universal a questões problemáticas, morais e éticas da sociedade”. CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito constitucional e teoria da Constituição, 7ª. ed., Almedina, Coimbra, 2000, pp. 1416-1417.
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