Revista da EMERJ - V. 21 - N. 3 - Setembro/Dezembro - 2019 - Tomo 2

565  R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 21, n. 3, t. 2, p. 556-595, set.-dez., 2019  TOMO 2 Nos dizeres de Câmara: “A técnica de decidir a partir de preceden- tes, empregando-os como princípios argumentativos, é uma das bases dos sistemas jurídicos anglo-saxônicos, ligados à tradição jurídica do common law . Isto não significa, porém, que o ordenamento jurídico brasileiro, his- toricamente vinculado à tradição jurídica romano-germânica (conhecida como civil law ), tenha migrado para o common law . Muito ao contrário, o que se tem no Brasil é a construção de um sistema de formação de deci- sões judiciais com base em precedentes adaptado às características de um ordenamento de civil law 35 .” Como se verá adiante, durante o processo legislativo, o incidente de resolução de demandas repetitivas foi aquele ao qual foi destinado maior atenção e menor consenso. Desse fato, resultou uma tentativa de deturpa- ção da ideia original por emenda parlamentar, que, ao final, foi superada com uma redação intermediária que pretendeu apaziguar os ânimos, crian- do, ao revés, inúmeras controvérsias interpretativas. O escopo do presente estudo é sustentar que a redação final, ape- sar de diversa do texto original, manteve a possibilidade de deflagração do incidente pelo juízo de primeiro grau, sem a necessidade de dissídio jurisprudencial e existência de processo pendente de julgamento nos Tri- bunais. Se assim não for, o incidente terá a sua finalidade esvaziada e não se refletirá em meio eficaz para o combate ao grave assoberbamento do Judiciário brasileiro 36 . O IRDR idealizado pela Comissão de Juristas do an- teprojeto Geralmente, a análise de um instituto jurídico tem como ponto de partida o seu texto legal definitivo e é dessa forma que boa parte da doutri- na costuma analisar o IRDR. Entretanto, em razão de fatos peculiares que ocorreram na deliberação e votação do projeto de lei, o estudo da sua gênese pelo demandante já tiver sido decidida em sede de recursos repetitivos (art. 311, II do CPC); a possibilidade de o relator julgar de plano conflito de competência quando sua decisão estiver fundada em orientação firmada em julgamento de recursos repetitivos (art. 955, parágrafo único, II do CPC). 35 CÂMARA, op. cit., p. 426. 36 Podem ser mencionadas, exemplificativamente, como causas do referido assoberbamento: crescimento da população, massificação das relações jurídicas, descumprimento dos preceitos constitucionais e legais pela própria Administração Pública, ausência de métodos extrajudiciais efetivos de solução de conflitos, maior acesso da população ao Judiciário, especialmente através dos Juizados Especiais, legislação processual até pouco tempo anacrônica e a escassez de recursos materiais e pessoais no Judiciário.

RkJQdWJsaXNoZXIy NTgyODMz