Revista da EMERJ - V. 21 - N. 3 - Setembro/Dezembro - 2019 - Tomo 2

 R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 21, n. 3, t. 2, p. 494-555, set.-dez., 2019  520 TOMO 2 atribuir-lhe o direito especial, inextensível aos seus membros, de julgar e punir não clientes? Nozick responde negativamente à pergunta, tendo em vista que (i) a coletividade (agência) tem, rigorosamente, os mesmos direitos que os seus membros, nada além ou diferente disso; (ii) e todos os indivíduos, clientes ou não, têm o direito de defender-se contra pro- cedimentos de aferição de culpa duvidosos ou injustos e punir aqueles que os usarem ou tentarem usá-los contra ele. Naturalmente, a agência dominante considera os seus procedimen- tos confiáveis e justos, e, portanto, punirá todos aqueles que duvidem da sua correção e lhe neguem aplicação. Note-se que nenhum monopólio de jure é vindicado: a agência não se autointitula a única detentora do uso legítimo da força, reconhecendo, ao contrário, que todos detêm o direito de defender os seus direitos naturais e de punir os transgressores. Todavia, ela age livremente quanto à definição de procedimentos justos de aferição de culpa em disputas que envolvam os seus clientes, de modo que, quando houver suspeita de lesão aos direitos dos clientes por não clientes, caberá à agência impor a sua vontade a respeito do teor do procedimento que, sob o seu ponto de vista, seja o mais correto. Em virtude do seu poder de definir um direito particular em deter- minado território, a agência dominante atua como juiz final de disputas que envolvam os seus clientes. Disso não decorre que possua um direito especial negado aos demais indivíduos, mas que dispõe de um excepcional poder fático de impor a sua solução a respeito de controvérsia que envol- va seus clientes em face de não clientes, podendo impedir que os últimos apliquem uma punição que lhe pareça equivocada. Afirma Nozick “aqui é o lugar de aplicar a ideia de um monopólio de facto: um monopólio que não é de jure , porque não constitui resultado de alguma concessão excepcio- nal de direitos exclusivos, enquanto os demais são excluídos de privilégio semelhante. Outras agências de proteção podem ingressar no mercado e tentar tirar clientes da agência dominante. E tentar substituí-la nessa con- dição. Mas o fato de já ser dominante concede-lhe uma importante vanta- gem de mercado na concorrência por clientes. E pode oferecer-lhes uma garantia que nenhuma outra pode igualar: Só os procedimentos que nós consideramos corretos serão usados no caso dos nossos clientes.” Diante do monopólio do uso da força, ultrapassa-se o estágio da agência dominante, atingindo-se

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