Revista da EMERJ - V. 21 - N. 3 - Setembro/Dezembro - 2019 - Tomo 2

517  R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 21, n. 3, t. 2, p. 494-555, set.-dez., 2019  TOMO 2 Diante das alvitradas distorções geradas quando se é juiz em causa própria, parece razoável supor que os revides excessivos e as punições in- justas levariam a animosidade e insegurança crescentes. Efetivamente, não há como se ter certeza de que uma contenda se encerrou, pois, “mesmo que uma parte diga que se absterá de atos de retaliação, a outra só poderá ficar tranquila se souber que a primeira não se sente ainda com direito à indenização ou a vingar-se e, por conseguinte, a tentar, quando se apresen- te condição favorável”. 36 Além da atuação isolada do indivíduo no Estado de Natureza com vistas a exigir respeito aos seus direitos, pode-se conceber que indivíduos se unam, por terem espírito público, por serem amigos, ou por terem rece- bido (ou por esperarem receber) favores da pessoa que ora é vítima. Gru- pos de indivíduos podem, portanto, formar associações de proteção mútua, de modo que sempre atuarão em conjunto para a proteção do direito de um dos seus membros. Tem-se, pois, a evolução do Estado de Natureza para as associações de proteção mútua ( caminhando-se do primeiro para o segundo estágio). Apesar de a união fortalecer a salvaguarda dos direitos dos mem- bros do grupo, as associações em tela apresentam sérias dificuldades: (i) deixam todos os seus membros em permanente sobreaviso, (ii) qualquer integrante pode solicitar os serviços do grupo, sob a alegação de violação atual ou iminente aos seus direitos. Além de o ininterrupto estado de alerta ser irrazoável, as inconveniências tendem a aumentar caso o grupo tenha membros paranóicos ou de má-fe, que, respectivamente, vislumbrem vio- lações inexistentes aos seus direitos ou utilizem tal subterfúgio para mal- ferir os direitos alheios. Saliente-se, entretanto, que esse problema tende a ser minimizado, visto que, muito provavelmente, serão estabelecidos métodos para deter- minar se o queixoso tem ou não razão, pois os membros do grupo não desejarão gastar tempo e energia em demandas absurdas ou mal intencio- nadas. A consequente diminuição das disputas consiste em significativa vantagem das associações de proteção sobre o Estado de Natureza. Por outro lado, a inconveniência da prontidão permanente dos seus membros pode ser resolvida pela divisão de trabalho ou pela contratação de pro- fissionais especializados em prover segurança. Assim, em típico modelo de livre iniciativa, Nozick sugere que empresas especializadas em prover 36 LOCKE, John. Op. cit., p. 26.

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