Revista da EMERJ - V. 21 - N. 3 - Setembro/Dezembro - 2019 - Tomo 2

507  R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 21, n. 3, t. 2, p. 494-555, set.-dez., 2019  TOMO 2 guir argumentos centrais das várias digressões contidas ao longo do texto, premissas fundamentais ao raciocínio são recortadas em várias páginas em meio a outros temas, ou mesmo não são tratadas, a argumentação é extre- mamente abstrata e o autor se vale de conhecimentos interdisciplinares, etc. Aliás, no prefácio de “Anarquia”, o próprio Nozick admite tratar-se de uma exploração filosófica que não pretende conter uma teoria comple- ta, senão “apresentações inacabadas, conjeturas, questões e problemas em aberto, indicações, conexões secundárias, bem como uma linha principal do argumento. Há espaço para palavras sobre assuntos que não sejam as últimas palavras”. 21 Todavia, tendo em vista o propósito da presente obra coletiva, buscar-se-á reconstruir as teses de Nozick de forma a iluminar os seus aspectos estruturais e a estabelecer conexões entre si, facilitando a sua compreensão. À vista desse propósito, dividiu-se a análise da sua obra em três tópicos. 2.2 Os direitos naturais à vida, à liberdade e à propriedade À guisa de introdução, cumpre-nos arrolar as principais caracterís- ticas da teoria de Robert Nozick sobre os direitos fundamentais, as quais serão desenvolvidas nos parágrafos seguintes. O filósofo de Harvard parte do pressuposto da (i) separação entre as pessoas , de onde extrai não se revelar moralmente legítima a imposição de um ônus a determinado indivíduo em benefício de outrem. Ademais, afirma que todos os indivíduos têm (ii) direitos à vida, à liberdade e à propriedade , ressaltando que o último se revela tão forte quanto os dois primeiros. Tais direitos são naturais (iii) , pois não se fundam no direito positivo, mas pertencem à pessoa humana, independentemente da cultura na qual ela se insira e da sua formal positivação, e (iv) visam a proteger uma zona de não interferência , qualificando-se, portanto, como direitos a abstenções estatais, ou di- reitos de defesa , segundo a moderna terminologia dos direitos fundamentais. Consistem, pois, em garantias em face de incursões arbitrárias num domí- nio em que deve prevalecer o autogoverno do indivíduo a respeito da sua vida, liberdades e possessões, e não atos coercitivos de outros indivíduos ou da coletividade. Ademais, tais direitos são (iv) invioláveis, (v) exaustivos no plano político e (vi) insuscetíveis de colidirem, efetivamente, com outros direitos ou valores , na medida 21 NOZICK, Robert. Anarquia, Estado e Utopia . Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1991, p. 12/13.

RkJQdWJsaXNoZXIy NTgyODMz