Revista da EMERJ - V. 21 - N. 3 - Setembro/Dezembro - 2019 - Tomo 2

499  R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 21, n. 3, t. 2, p. 494-555, set.-dez., 2019  TOMO 2 somente instituir uma estrutura neutra apta a evitar violações aos direitos individuais e a viabilizar que cada um possa perseguir o seu projeto pessoal de vida, a sua própria utopia. Aliás, desde há muito se salienta que as tenta- tivas de se impor paraísos na Terra redundam, normalmente, em infernos, é dizer, em totalitarismo sob os mais variados rótulos. Das breves considerações sobre os papéis exercidos pelo individu- alismo e pelo reconhecimento do pluralismo no bojo do libertarianismo, infere-se a sua proximidade com a tradicional corrente liberal. Em seu âmbito, contudo, deve-se distinguir os liberalismos político e econômico. O liberalismo político consiste em doutrina a respeito dos limites dos po- deres públicos, fundada, basicamente, na noção de que os indivíduos têm direitos oponíveis ao Estado e na garantia de moderação do poder estatal através de mecanismos de fracionamento das funções públicas em órgãos independentes (separação de poderes). O conceito de Estado de Direito, erigido como uma espécie de “antileviatã”, 9 se consubstancia, por sua vez, em pedra de toque do liberalismo político, na medida em que busca igual propósito de limitação do arbítrio estatal através de expedientes diversos: normas gerais, abstratas e prévias, aplicáveis a governantes e governados, independência do Judiciário, limitação da ação do Executivo à lei, previsão dos direitos individuais numa lei superior (direito natural ou constituição rígida), etc. Assim, parte-se da premissa de que a proteção do indivíduo é a finalidade última da criação do Estado e do Direito, de maneira que ga- rantias inerentes à dignidade humana não poderão ser suprimidas mesmo que tal medida seja fundamentada na maximização do bem-estar coletivo, sob pena de o Estado ir de encontro ao propósito fundamental que ins- pirou a sua criação. Resta, portanto, resguardado um domínio de atuação individual infenso a intervenções estatais, em cujo âmbito deve prevalecer a liberdade individual em detrimento da coerção estatal. Enquanto o liberalismo político postula um Estado limitado (Esta- do de Direito), o liberalismo econômico propugna por um Estado mínimo, é dizer, uma mínima intervenção estatal na economia, zelando os pode- res públicos, basicamente, pelas liberdades civis, pela propriedade priva- da, pela livre iniciativa, pela autonomia da vontade e pelo regular cumpri- mento dos contratos, visto que, quando a atuação do Estado transcender 9 MIAILLE, Michel. Le retour de l’Etat de droit. Le débat en France. In: CÓLAS, Dominique (org.) LÉtat de droit: travaux de la mission sur la modernisation de lÉtat . Paris: PUF, 1987, p. 218.

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