Revista da EMERJ - V. 21 - N. 3 - Setembro/Dezembro - 2019 - Tomo 2
R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 21, n. 3, t. 2, p. 394-442, set.-dez., 2019 432 TOMO 2 um direito subjetivo a fugir da incidência tributária, como alguns podem pensar 122 . Essa confusão ocorre porque é comum as pessoas já não se re- cordarem de que as principais formulações sobre o contrato social foram concebidas como um acordo entre pessoas e não entre essas e o Estado, o que é um desvio de percepção bastante comum 123 . O Estado é um projeto coletivo, financiado pela contribuição de toda a Sociedade, e, portanto, o pagamento de tributos é um dever fundamental estabelecido constitucio- nalmente 124 . Essa noção decorre diretamente da feição Fiscal 125 assumida pelo Estado contemporâneo 126 e é a contrapartida ao elenco de direitos fundamentais constitucionalmente assegurados 127 . Quanto a esse ponto, o voto do Ministro Luís Roberto Barroso foi preciso ao afirmar que “todos os membros da sociedade têm o dever de contribuir, na capacidade econômica manifestada, para o sucesso desse projeto coletivo que, repita-se, tem como principal forma de financiamento a receita advinda de tributos.” 128 . Sendo assim, para garantir também a igualdade na aplicação da lei e impedir que alguns se afastem do dever de contribuir para a manutenção do Estado, o Ministro Luís Roberto Barroso afirma que “ é necessária a criação de regras 122 J osé C asalta N abais afirma que “Como dever fundamental, o imposto não pode ser encarado como mero poder para o estado, nem como mero sacrifício para os cidadãos, constituindo antes o contributo indispensável a uma vida em comunidade organizada em estado fiscal.” Nabais, José Casalta. O Dever Fundamental de Pagar Impostos. Contributo para a compreensão constitucional do estado fiscal contemporâneo . Coimbra: Almedina, 2009, p. 679. 123 Shapiro, Ian. Os fundamentos morais da política/ tradução: Fernando Santos . São Paulo: Martins Fontes, 2006, pp. 145-146. 124 Na visão de Ricardo Lobo Torres: “o tributo se define como dever fundamental estabelecido pela Constituição no espaço aberto pela reserva da liberdade e pela declaração dos direitos fundamentais. transcende o conceito de mera obri- gação prevista em lei, posto que assume dimensão constitucional.” Torres, Ricardo Lobo. Tratado de Direito Constitucional Financeiro e Tributário: Valores e Princípios Constitucionais Tributários – vol. II . Rio de Janeiro: 2005, p. 181. 125 No Estado Fiscal os tributos arrecadados dos particulares são a principal fonte de custeio do Estado, superando o modelo anterior do estado Patrimonialista, em que o Estado era financiado basicamente pela exploração de seu próprio patrimônio. Não significa que no Estado Fiscal não haja mais a exploração do patrimônio estatal, mas apenas que essas receitas passam a ter uma reduzida importância frente aos valores amealhados pela via tributária. Para um estado mais completo sobre a diferença dos dois modelos: Torres, Ricardo Lobo. A Idéia de Liberdade no Estado Patrimonial e no Estado Fiscal. Rio de Janeiro: Editora Renovar, 1991. Também para uma sistematização sobre as principais características do Estado Fiscal, ver: 126 Juan Manuel Barquero Estevan, citando Josef Isensee colaciona as principais características do Estado Fiscal Este- van, Juan Manuel Barquero. La Función Del tributo em El Estado social y democrático de Derecho . Madrid: Centro de Estudos Políticos y Constitucionales, 2002. Págs. 21-22 127 José Casalta Nabais, em síntese, sustenta que não há necessidade de uma cláusula constitucional explícita que esta- beleça o pagamento de tributos como uma um dever fundamental. Para o referido autor, basta que uma Constituição preveja em seu corpo uma “constituição fiscal”, ou se constitua efetivamente em um Estado Fiscal ou ainda traga um rol de direitos fundamentais cuja promoção, garantia e defesa, por certo, dependerá dos valores recolhidos pela via dos tributos. Nabais, José Casalta. O Dever Fundamental de Pagar Impostos. Contributo para a compreensão constitucional do estado fiscal contemporâneo . Coimbra: Almedina, 2009, p. 63. 128 Trecho do voto proferido pelo Ministro Luís Roberto Barroso no julgamento conjunto das ADI’s 2.390, 2.386, 2.397 e 2.859 e do RE 723.651, com repercussão geral, julgado pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal em 24/02/2016.
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