Revista da EMERJ - V. 21 - N. 3 - Setembro/Dezembro - 2019 - Tomo 1
95 R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 21, n. 3, t.1, p. 87-120, set.-dez., 2019 TOMO 1 de penas e escolha de regimes prisionais no Brasil. Uma das tarefas mais relevantes nesse contexto é a de contribuir para a superação dos resquícios de direito penal do autor em prestígio de um direito penal do fato. Como afirmou o Ministro Luís Roberto Barroso, “o direito penal nao se destina a punir meras condutas indesejaveis, ‘personalidades’, ‘meios’ ou ‘modos de vida’, e sim crimes, isto é, condutas significativamente perigosas ou lesivas a bens jurídicos, sob pena de se configurar um direito penal do autor, e nao do fato” 13 . O direito penal do autor é aquele que considera legítimo submeter o criminoso à pena em razão da sua personalidade anormal e perigosa, enquanto o direito penal do fato estabelece que o criminoso se submete à pena não porque seja um ser anormal e perigoso por natureza, senão porque, independentemente da sua personalidade, cometeu uma conduta punível. Um sistema penal que busque se afastar da lógica do direito penal do autor deve impedir que características pessoais do autor que não te- nham expressão na culpabilidade revelada pelo fato sejam levadas em con- sideração para majorar sua pena. Esse tipo de raciocínio não é estranho à experiência comparada. O Tribunal Constitucional da Alemanha, por exemplo, em sentença proferida em 1979, considerou que a adequação do dispositivo legal que estabelece uma causa geral de agravação da pena com base na reincidência à Constituição afasta a sua aplicação nos casos em que a reincidência não implique uma presunção de maior culpabilidade do réu, de modo que o juiz deve verificar, caso a caso, se é possível reprovar mais intensamente a conduta do reincidente que não tenha considerado como advertências as condenações anteriores 14 . Alguns anos depois, em 1986, a causa de agravação da pena pela reincidência foi revogada no Código Penal alemão 15 . De fato, as características pessoais do acusado que não tenham ga- nhado expressão concreta no fato punível não devem assumir qualquer relevância para a dosagem da pena, sob pena de se promover típico direito penal do autor. Nesse sentido, levar a sério a ideia de um direito penal do 13 STF, HC 123108, Rel. Min. Luís Roberto Barroso, Tribunal Pleno, j. em 03.08.2015. 14 A jurisprudência alemã realizou verdadeira interpretação conforme à Constituição do instituto da reincidência. A sentença alemã é referida pela Corte Constitucional da Colômbia na Sentencia C-181/2016. Esse entendimento não é necessariamente contrário à jurisprudência do STF que reconheceu a constitucionalidade da reincidência como agravante da pena (RE 453.000/RS)” (HC 93815, Rel. Min. Gilmar Mendes, Tribunal Pleno, j. em 04.04.2013). 15 ROXIN, Claus. Derecho penal: parte general , Tomo I – Fundamentos. La estructura de la teoria del delito. Trad. Diego-Manuel Luzon Pena et al. Madrid: Civitas, 1997, p. 186.
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