Revista da EMERJ - V. 21 - N. 3 - Setembro/Dezembro - 2019 - Tomo 1
R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 21, n. 3, t. 1, p. 87-120, set.-dez., 2019 92 TOMO 1 grande parte dos paises ocidentais, a pena privativa de liberdade assume a posiço de principal resposta estatal pela violaço do dever exigido criminalmente” 5 . Apesar da crescente percepção da ineficácia da política de encar- ceramento, aproximadamente metade das sentenças criminais brasileiras, incluindo as de absolvição e as que reconhecem a prescrição, aplicam aos réus penas de prisão. A quantidade de sentenças que aplicam penas privati- vas de liberdade é quase quatro vezes superior ao volume de sentenças que aplicam penas restritivas de direito 6 . Mais grave ainda é verificar que cerca de 23% dos condenados a penas de prisão receberam penas inferiores a quatro anos de reclusão ou detenção. Apenas para que se tenha uma ideia mais real do significam esses dados, hoje no Brasil mais 170 mil presos re- ceberam penas inferiores a quatro anos de reclusão ou detenção. O marco é relevante porque, nos termos do Código Penal, penas inferiores a quatro anos de reclusão podem sem cumpridas em regime prisional aberto (art. 33) e admitem substituição por penas restritivas de direito (art. 44). O crescimento da aposta do sistema de justiça criminal na pena de prisão tem aumentado sistematicamente ano após ano. Não há qualquer sinal no horizonte de que a taxa de encarceramento irá diminuir, apesar da larga demonstração da sua ineficiência para reduzir os índices de crimi- nalidade e violência. A falta de eficácia da pena de prisão na contenção da prática delitiva não tem sensibilizado nem as instituições que programam e aplicam a política criminal nem a sociedade civil. Ao contrário, a baixa qualidade do debate público em torno desse tema tem reproduzido um discurso de ampliação contínua do sistema carcerário, apesar das múltiplas evidências do seu fracasso 7 . O reconhecimento pelo STF, no ano de 2016, do estado de coisas inconstitucional do sistema prisional brasileiro teve baixo impacto na modificação dos termos do debate público e efeito irrelevante no seu funcionamento real. Nunca foi tão urgente a tarefa de converter em realidade a promes- sa de reservar à prisão um espaço residual no sistema de justiça criminal. 5 SALVADOR NETTO, Alamiro Velludo. Finalidades da pena, conceito material de delito e sistema penal integral . 2008. Tese (Doutorado em Direito Penal) - Faculdade de Direito, Universidade de São Paulo, São Paulo, p. 254. 6 BRASIL. Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada. A Aplicação de Penas e Medidas Alternativas . Brasília: IPEA, 2015 (Relatório de pesquisa), p. 37. 7 Como referiu o Ministro Ricardo Lewandowski, as demandas por valorização da cultura do encarceramento, “destituídas de qualquer fundamento racional, não lograram apresentar – como ficou evidenciado – qualquer resultado positivo para o incremento da segu- rança pública. Pelo contrário, tão somente demonstraram que a violência estatal acaba gerando mais violência social” (BRASIL. Postulados, Princípios e Diretrizes para a Política de Atendimento às Pessoas Egressas do Sistema Prisional . Brasília: Ministério da Justiça, Depar- tamento Penitenciário Nacional, 2016, p. 7).
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