Revista da EMERJ - V. 21 - N. 3 - Setembro/Dezembro - 2019 - Tomo 1

43  R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 21, n. 3, t. 1, p. 36-54, set.-dez., 2019  TOMO 1 Apesar de bem assistido, o réu enfrentava obstáculos e dificuldades que oneravam em demasia o trabalho da defesa técnica. Com efeito, já na largada do processo, via-se o acusado impotente diante da autorização legal – e jurisprudencial – de ser recebida a acusação mediante simples despacho, despido de qualquer motivação. Em seguida, sujeitava-se o réu a ser interrogado pelo magistrado tal qual uma entrevista pessoal, sem a necessária assistência de advogado e sem a observância de certas garantias processuais, entre as quais a de poder permanecer silente, sem que tal comportamento implicasse confissão tácita, e a de ter conhecimento pré- vio da acusação, ao menos nos casos em que se encontrava preso, quando era requisitado junto ao estabelecimento prisional no dia do interrogatório judicial sem ter sido anteriormente citado. Ademais, se não encontrado e citado por edital, seguia-se o fluxo do processo até final condenação do réu, à sua revelia. Mesmo nos primeiros anos de vigência da Constituição de 1988 ainda era corrente a desvalia dos direitos do acusado em processo pe- nal, notadamente o direito a uma defesa técnica efetiva. Adauto Suannes (1999, p. 349) anotava: Se a Constituição considera a presença do Advogado indis- pensável para que tenhamos um fair trial , para que essa con- quista duramente batalhada ao longo da conceituação da due process clause não seja algo meramente formal, como aceitar- se que seu trabalho seja considerado algo absolutamente despiciendo? De fato, segundo a jurisprudência, a presença do defensor no interrogatório judicial é dispensável, a defesa prévia é dispensável, a intimação do defensor da data da audiência que se realizará no juízo deprecado é dispensável, as alegações finais são dispensáveis, a interposição de recurso contra a sentença condenatória é dispensável, as razões de recurso são dispensáveis, as contrarrazões do recurso são dispensáveis, os embargos infringentes são dispensáveis, a atuação em revisão criminal é dispensável. E concluía, com um certo sarcasmo: “E isso porque a Constituição diz que o Advogado é indispensável. Imagine-se se ela dissesse ser ele dis- pensável!” (SUANNES, 1999, p. ??)

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