Revista da EMERJ - V. 21 - N. 3 - Setembro/Dezembro - 2019 - Tomo 1

303  R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 21, n. 3, t. 1, p. 272-314, set.-dez., 2019  TOMO 1 nalidade globalmente considerada uma avaliação sobre a intensidade e abrangência da violação às normas constitucionais: quanto mais grave for o grau de inefetividade constitucional, mais forte deve ser a interven- ção jurisdicional corretiva. Na mensuração da intensidade da violação, deve-se ter em conta aspectos como o caráter disseminado da prática, bem como o seu enraizamento. Nos cenários de violações gravíssimas, estaremos diante de práticas inconstitucionais tão sedimentadas e natu- ralizadas que assumem os contornos de verdadeiros costumes incons- titucionais, nos quais se verificam a passividade e anestesia, tanto das instituições estatais como da sociedade em geral. A adoção de um critério quantitativo decorre também da constata- ção de que a configuração de uma inconstitucionalidade envolve, além de um exame de validade, outro de efetividade. Essa relação pode se mani- festar de formas pouco intuitivas, como ilustra o fenômeno da inconstitu- cionalidade superveniente. Na aferição desta, é a concretização do projeto constitucional por mudanças fáticas e jurídicas que produz a nulidade da norma impugnada, e não o mero cotejo textual dos dispositivos legais e constitucionais 66 . Isso demonstra que a inconstitucionalidade de um ato normativo é influenciada pelos fatos, ou – pondo em outros termos – que efetividade e validade são fenômenos que se entrelaçam no exame da con- gruência entre um ato e a Constituição. É certo, porém, que a avaliação quantitativa da inconstituciona- lidade deve vir acompanhada de um exame qualitativo, que tenha em conta a importância axiológica das normas violadas. Em Constituições extensas e detalhistas, como a nossa, há uma enorme heterogeneida- de na relevância valorativa dos dispositivos. Nessa ordem de ideias, a inefetividade quanto à implementação de normas apenas formalmente constitucionais é menos grave do que o descumprimento de normas que integram o núcleo material que conforma a identidade valorativa da Constituição. Assim, ao standard anterior deve ser associado outro, relativo à vertente qualitativa da inconstitucionalidade, que pode ser ex- 66 Assim, retomando-se os exemplos já apresentados no tópico III.2, no exemplo da implementação da defensoria pública, é a concretização desse objetivo, disposto na Constituição, que, supervenientemente, torna inconstitucional o art. 68 do CPP, que atribui ao Ministério Público a legitimação para pleitear reparação quando a vítima for pobre. No caso do Benefício de Prestação Continuada, é a previsão em outros diplomas legais de critérios mais benéficos de acesso a benefícios assistenciais do art. 20, § 3º, da LOAS – originalmente constitucional - que o torna insuficiente diante da Constituição, a qual busca conferir graus progressivos de assistência aos desamparados.

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