Revista da EMERJ - V. 21 - N. 3 - Setembro/Dezembro - 2019 - Tomo 1
R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 21, n. 3, t. 1, p. 272-314, set.-dez., 2019 302 TOMO 1 Com efeito, ainda que tenhamos ao longo deste artigo priorizado o exame das omissões inconstitucionais, é interessante notar que, afora o caráter relacional (de comparação), todos os aspectos que integram o conceito de inconstitucionalidade foram expandidos nas últimas décadas. Há uma relação de implicação recíproca entre essas mudanças de paradig- ma e o conhecido fenômeno global de crescimento do protagonismo do Judiciário. Naturalmente, essa nova realidade intensifica a tensão ancestral entre constitucionalismo e democracia. Por isso, o tratamento teórico do fenômeno da inconstitucionalidade não prescinde da avaliação sobre de que forma a autonomia democrática e a liberdade do legislador devem ser tomadas em conta quando de sua análise. Se a inconstitucionalidade é um fenômeno que, não raro, se apresenta de forma sistêmica e multidimen- sional, de que forma será possível calibrar o raio de ação do Judiciário, preservando uma arena significativa para a deliberação democrática? Em nossa visão, a fórmula para integrar essas duas grandezas em oposição ao conceito de inconstitucionalidade é operar com uma análise de gradação, incorporando a este último a intensidade da violação . A existência de um grau acentuado de incompatibilidade entre as normas constitucionais e os com- portamentos analisados torna-se, assim, um elemento decisivo para sua qualificação em juízo como inconstitucionais. Trabalhando a partir de uma ótica gradualista, o reconhecimento de que a inconstitucionalidade pode se manifestar de forma multidimensional não acarretará a transformação do Judiciário na espinha dorsal do constitucionalismo, no dirigente defini- tivo e supremo de todas as controvérsias que possam, de forma direta ou indireta, ser reconduzidas à constituição. Ao inserir uma dimensão quantitativa na formulação do conceito de inconstitucionalidade, inspiramo-nos na teoria das margens de ação, de Robert Alexy, calcada na compreensão da constituição como ordem- -moldura em sentido qualitativo. Embora desenvolvida, inicialmente, com foco na relação entre Constituição e Parlamento, é certo que o seu cerne diz respeito à forma de se acomodar o convívio entre órgãos elei- tos democraticamente e órgãos não eleitos, responsáveis por controlar as atividades dos primeiros à luz da Constituição. Assim, seu esquema básico pode ser transplantado para a estrutura estatal de modo geral, já que nenhum órgão público se situa em uma espécie de zona franca da Constituição. Nessa linha, propomos aplicar à ideia de constitucio-
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