Revista da EMERJ - V. 21 - N. 3 - Setembro/Dezembro - 2019 - Tomo 1
289 R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 21, n. 3, t. 1, p. 272-314, set.-dez., 2019 TOMO 1 a jurisdição constitucional, por serem legisladores negativos, não estariam autorizados a superar omissões legislativas para sanar inconstitucionalida- des. Entretanto, já não se afigura mais possível ater-se cegamente a essa perspectiva a respeito da natureza e função dos tribunais constitucionais e desviar os olhos do fenômeno das sentenças manipulativas – praticadas já há algumas décadas em Cortes Constitucionais europeias, sobretudo na italiana – e também, inequivocamente, pelo Supremo Tribunal Federal. Encurtando-se, por brevidade, extenso debate doutrinário existente a respeito da técnica de decisão das sentenças manipulativas 35 , uma das principais vertentes teóricas sobre esse assunto, que se adota no presente estudo, é a que a concebe como um mecanismo de integração de lacunas normativas 36 . De forma igualmente simplificada, entendemos que o recur- so ao mecanismo integrativo é possível nas situações em que seja possível identificar solução constitucionalmente obrigatória ao caso, isto é, unidade de solução normativa 37 . A manifestação mais emblemática das sentenças manipulativas são as sentenças aditivas direcionadas à tutela do princípio da isonomia. A hi- pótese é de uma omissão inconstitucional parcial relativa – a incompatibi- lidade com a Constituição decorre de o ato normativo atribuir tratamento diverso a categorias de destinatários diferentes, de forma ilegítima, isto é, sem esteio constitucional. Superando-se a visão tradicional de que, nessas hipóteses, nada restaria ao ente jurisdicional, senão a sinalização da in- constitucionalidade ao parlamento e a decretação de sua mora, essa espé- cie de sentença aditiva expande o âmbito de incidência pessoal da norma, incorporando o grupo discriminado ao tratamento normativo mais bené- fico, independentemente de isso ser, ou não, comportado pela literalidade mínima do preceito controlado. Na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, hipótese indiscutí- vel de sentença aditiva corresponde a julgado relativo à pensão por morte dos dependentes de servidores do estado de Minas Gerais. De acordo 35 Sobre a categoria das sentenças manipulativas, em caráter analítico, v. GONÇALVES, Gabriel Accioly. O desenvolvimento judicial do direito : construções, interpretação criativa e técnicas manipulativas. Dissertação (Mestrado em Direito) – Univer- sidade do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2015. 36 Adotando essa perspectiva, v. CRISAFULLI, Vezio. Lezioni di diritto costituzionale . Pádua: CEDAM, 1984, p. 407-8; SILVESTRI, Gaetano. Le sentenze normative della Corte Costituzionale, Giurisprudenza Costituzionale , v. XXVI, n. 8, 1981, p. 1684-1721; PICARDI, Nicola. Le sentenze integrative della Corte costituzionale. In: PICARDI, Nicola et. al. Aspetti e tendenze del diritto costituzionale: scritti in onore di Costantino Mortati , v. 4, Roma: Giuffrè, 1977, p. 597-634. 37 CRISAFULLI, Vezio. Lezioni di diritto ..., op. cit., p. 407-408.
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