Revista da EMERJ - V. 21 - N. 3 - Setembro/Dezembro - 2019 - Tomo 1

 R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 21, n. 3, t. 1, p. 236-240, set.-dez., 2019  240 TOMO 1 cuja proteção e promoção incumbem também ao Estado, dada a sua evidente imbricação com o interesse de toda a coletividade. Assim se dá, por exemplo, com a liberdade de expressão, de pensamento, criação intelectual e artística, de locomoção e de exercício profissional. A ação protetiva e promocional do Estado se dá em favor de cada um e de todos, a um só tempo. No que se refere ao item (ii), há um variado cardápio de exemplos em que a solução do conflito entre o indivíduo e a sociedade envolve juízos de ponderação que ora pendem para um lado, ora para outro. No campo dos contratos administrativos, é conhecida a cláusula exorbitante que relativiza a possibilidade de utilização da exceptio non adimpleti contractus (exceção do contrato não cumprido) pelo particular contra o Estado. O art. 78, inciso XV, da Lei n° 8.666/1993 assegura ao contratado, em caso de atraso nos pagamentos superior a 90 dias, o direito de optar pela sus- pensão do cumprimento de suas obrigações até que seja normalizada a situação. Isto é, há um prazo de tolerância para a mora administrativa de três meses, dentro do qual fica interditada a possibilidade da paralisação das atividades pelo particular. Vencido tal prazo, abre o legislador ao con- tratado a alternativa entre postular a rescisão contratual ou lançar mão da exceção do contrato não cumprido. A aplicação da lógica dicotômica nos levaria a reconhecer uma su- posta supremacia do interesse público até o 90º dia de atraso no pagamen- to, e uma suposta supremacia do interesse particular a partir do 91º dia de mora. Isso, evidentemente, não faz nenhum sentido. O legislador fez apenas um balanceamento dos interesses em jogo: limitou o exercício da exceptio por um prazo que entendeu razoável (pensando certamente na im- portância da continuidade das atividades administrativas para os cidadãos), mas liberou o particular para exercê-la vencido tal prazo, pois nenhuma empresa seria capaz de cumprir suas obrigações se estivesse condenada a ter de suportar o inadimplemento de seus contratantes por longo prazo. O problema é a forma de enxergar a questão e a insistência com a pergunta do tipo tudo ou nada: afinal, de quem é a supremacia, do público ou do privado, da sociedade ou do indivíduo? Afinal o copo está meio cheio ou meio vazio? O erro está na pergunta. E não há resposta certa para a pergunta errada.

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