Revista da EMERJ - V. 21 - N. 3 - Setembro/Dezembro - 2019 - Tomo 1

 R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 21, n. 3, t. 1, p. 205-235, set.-dez., 2019  220 TOMO 1 O procedimento francês de não admissão foi impugnado perante a Corte Europeia de Direitos Humanos. No caso Burg et autres c. France , os requerentes questionavam uma decisão da Câmara Social da Corte de cassação francesa, que não admitiu um apelo porque os motivos apresen- tados não seriam “de natureza a permitir a admissão do recurso”. Perante a Corte de Direitos Humanos, alegou-se incompatibilidade do art. L131- 6 do Código de Organização Judiciária da França com o art. 6º, 1, da Convenção Europeia de Direitos Humanos, sede internacional do dever de motivação das decisões judiciais. A Corte Europeia, porém, validou o filtro da Cour de cassation , assim como já havia feito a respeito do Conselho de Estado. 48 Decidiu-se que “incumbe aos tribunais responder aos argu- mentos essenciais das partes, sabendo-se que a extensão desse dever pode variar segundo a natureza da decisão e deve assim ser analisado à luz das circunstâncias da espécie (...)”. Afirmou, ainda, que “o art. 6º não exige que seja detalhadamente motivada uma decisão pela qual uma instância recursal, com base numa disposição legal específica, inadmite um recurso como desprovido de chances de êxito”. E concluiu: Na espécie, a Corte observa que a decisão da Corte de Cassação fundou-se na ausência de motivos de natureza a permitir a ad- missão do recurso, nos termos do art. L131-6 do Código de Or- ganização Judiciária, tal qual modificado pela Lei nº 2001-539, de 25 de junho de 2001. Nessas condições, ela não revela nenhuma aparência de violação ao art. 6, §1º, da Convenção. 49 Essa linha jurisprudencial da Corte Europeia foi posteriormente reafirmada em várias ocasiões, mesmo em matéria penal, de modo que está consolidada. 50 48 Caso Société Anonyme Immeuble Group Kosser c. France , Requête nº 38748/97, j. 9.3.1999. 49 Caso Burg et autres c. France , Requête nº 34763/02, j. 28.1.2003. Tradução livre do autor. No original: “Il incombe aux juridictions de répondre aux moyens de défense essentiels, sachant que l’étendue de ce devoir peut varier selon la nature de la décision et doit donc s’analyser à la lumière des circonstances de l’espèce (...). Enfin, la Cour rappelle sa jurispruden- ce selon laquelle l’article 6 n’exige pas que soit motivée en détail une décision par laquelle une juridiction de recours, se fondant sur une disposition légale spécifique, écarte un recours comme dépourvu de chance de succès (…). En l’espèce, la Cour note que la décision de la Cour de cassation était fondée sur l’absence de moyens de nature à permettre l’admission de la requête au sens de l’article L. 131-6 du code de l’organisation judiciaire, tel que modifié par la loi nº 2001-539 du 25 juin 2001. Dans ces conditions, elle ne décèle aucune apparence de violation de l’article 6 §1º de la Convention”. 50 Para uma relação de precedentes da Corte Europeia nesse sentido, cf. GIANNINI, Leandro. El certiorari : la jurisdicción discrecional de las Cortes Supremas. La Plata: Librería Editora Platense, 2016. t. I, p. 458.

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