Revista da EMERJ - V. 21 - N. 3 - Setembro/Dezembro - 2019 - Tomo 1

111  R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 21, n. 3, t.1, p. 87-120, set.-dez., 2019  TOMO 1 nessa dimensão da compensação destrutiva da culpabilidade (por restrições de direitos fundamentais impostas legítima ou ilegitimamente pelo Estado) – resultará na releitura constitucional da detração penal, para permitir que todas essas restrições de direitos sejam devidamente consideradas pelo juiz, seja na fixação da pena em sentença, seja no seu redimensionamento durante a execução. A ausência de previsão legal para a compensação integral e obriga- tória das restrições de direito sofridas pelo réu como resposta estatal ao cometimento do delito constitui um “ estado indesejável de vácuo normativo ” 47 . De fato, a omissão do legislador em instituir um regime legal de detração dessas restrições – tanto das medidas cautelares como das violações atí- picas aos mais diversos direitos fundamentais no curso do processo e da execução da pena – criou uma situação jurídica de patente violação aos postulados constitucionais da culpabilidade, do ne bis in idem e da propor- cionalidade sancionatória. Essa evidente lacuna normativa, por importar em violação objetiva a direitos fundamentais dos condenados, pode ser enquadrada como verdadeira omissão inconstitucional. Tal vácuo norma- tivo indesejado implica, ainda, violação ao princípio da proporcionalidade na vertente da proibição da proteção insuficiente 48 . Nesse contexto, doutrina e jurisprudência têm reconhecido a ana- logia como a técnica mais adequada para que o Poder Judiciário supere esse quadro de omissão legislativa, permitindo a adaptação do antigo e defasado regime legal binário da detração penal – em que se compensa apenas o período de prisão preventiva – com o novo regime legal gradu- ado e flexível das medidas cautelares penais 49 . Como tem demonstrado a 47 A expressão foi utilizada pelo STF no julgamento da Rcl 8643, Rel. Min. Dias Toffoli, j. em 03.05.2010. 48 Sobre o tema, v. RODRIGUES, Luis Fernando Matricardi. O STF às voltas com a “navalha de Ockham”: uma proi- bição de insuficiência como controle de proporcionalidade das omissões?. In: VOJVODIC, Adriana; PINTO,, Henrique; GORZONI, Paula; SOUZA, Rodrigo P. de. Jurisdiço Constitucional no Brasil . Sao Paulo: Malheiros, 2012, p. 324-326; e SOUSA FILHO, Ademar Borges de. Sentenças aditivas na jurisdição constitucional brasileira . Belo Horizonte: Editora Fórum, 2016, p. 31- 49. 49 O Ministro Luís Roberto Barroso resenhou as hipóteses mais comuns de reconhecimento do direito à remição sem correspondência na lei penal: “o direito processual penal tem admitido a remição da pena em hipóteses não contempladas na LEP, inclusive criadas por Tribunais. A própria remição penal pelo estudo foi concedida durante muitos anos por decisões judiciais (ha julgados do STJ que datam de 2003 e ate uma súmula sobre o tema), mas apenas em 2011 ganhou previsão legal. Atualmente, também a remição pela leitura e aplicada, no âmbito federal, sem que haja autorização em lei. A hipótese e regulada pela Portaria Conjunta Depen/CJF no 276, de 2012, que prevê a possibilidade de redução de 4 dias de pena por obra lida por mês pelo detento, no limite de 48 dias de remição de pena por ano, e foi objeto da Recomendação no 44/2013, do CNJ, que orientou os Tribunais estaduais a reconhecerem a remição pela leitura de acordo com os mesmos critérios” (STF, RE 580252, Rel. Min. Teori Zavascki, Red. p/ acórdão: Min. Gilmar Mendes, Tribunal Pleno, j. em 16.02.2017).

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