Revista da EMERJ - V. 21 - N. 3 - Setembro/Dezembro - 2019 - Tomo 1
R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 21, n. 3, t. 1, p. 87-120, set.-dez., 2019 102 TOMO 1 sistema de justiça criminal, desde a investigação até a execução da pena. Essa ideia foi proposta de forma inovadora no Brasil pelo Ministro Luís Roberto Barroso no julgamento do RE 580252, ocasião em que defendeu a possibilidade de compensar violações a direitos fundamentais dos presos no tempo de pena e na modalidade do seu cumprimento. Atualmente, as violações de direitos fundamentais dos presos brasileiros assumem caráter de penas autônomas, que se somam à pena fixada na sentença e institucio- nalizam um modelo de aplicação de penas cruéis sem o devido processo legal, em patente restrição desproporcional dos princípios da culpabilida- de e do ne bis in idem . Esse debate, iniciado no Brasil com o ajuizamento da ADPF 347 e posterior julgamento das medidas cautelares pelo STF, deve ser aprofundado para permitir uma adequada compreensão dos seus fundamentos e das suas potencialidades. É o que se verá a seguir. V. Equivalentes funcionais da pena: as múltiplas restrições dedireitos fundamentais sofridas pelo indivíduo no curso da investigação, do processo e da execução penal a partir da visão do Ministro luís Roberto Barroso A pena criminal possui duas dimensões fundamentais, conhecidas como dimensão comunicativa e dimensão aflitiva . Na dimensão comunicativa , a pena constitui uma expressão da existência de um injusto culpável atribuível ao autor; já na dimensão aflitiva , a pena configura a imposição de sofrimento ao autor do delito. A doutrina costuma assinalar que a imposição de uma carga aflitiva ao réu deve se somar à dimensão comunicativa da condena- ção para garantir que o direito penal desempenhe função preventiva 27 . O reconhecimento dessa dimensão aflitiva da pena conduz à ampliação do seu sentido, na medida em que torna clara a realidade segundo a qual o indivíduo submetido à persecução penal pode sofrer as consequências de um conjunto amplo de restrições de direitos fundamentais como resposta ao cometimento do delito e que todas elas devem ser devidamente consi- deradas pelo Estado como aspectos ou dimensões da pena. 27 O Professor von Hirsch defendeu a ideia de que a reprovação tem uma dimensão restrospectiva e que a causação do dano ao criminoso carrega uma visão prospectiva do necessário em termos preventivos. V. VON HIRSCH, Andrew. The Justification for Punishment’s Existence: Censure and Prevention. In: VON HIRSCH, Andrew; ASHWORTH, Andrew (eds). Proportionate Sentencing : Exploring the Principles. Oxford; New York: Oxford University Press, 2005, p. 13 e ss.
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