Revista da EMERJ - V. 21 - N. 2 - Maio/Agosto - 2019
R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 21, n. 2, p. 52-118, Maio-Agosto, 2019 60 – e se vincularam ao que chamamos de “positivismo do Estado de Direi- to”. Costuma-se mencionar apenas um punhado de nomes, sempre com os matizes de costume: Thoma, Radbruch, Nawiasky, W. Jellinek e Ans- chütz. E para por aqui. 12 A enorme potência teórica de Kelsen e sua escrita incansável não encontraram terreno fértil em uma academia profunda- mente marcada pela nostalgia do Estado Guilhermino e que se lamentava pela decadência daquela Alemanha que havia saído derrotada da Primeira Guerra Mundial. Em um contexto marcado por nostalgias do império, sede de autoridade, temor aos movimentos populares, desconfiança frente aos frios procedimentos democráticos que Weimar tencionava instaurar, suspeita dos direitos fundamentais modelados na Constituição e que eram considerados expressão de uma enésima tentativa de submeter a Alema- nha aos imperativos de um individualismo liberal, dissolvente e destruti- vo das essências nacionais e comunitárias, é crível que, depois de 1933, a doutrina se achava – como tantas vezes afirmou-se – impregnada do kel- senismo que se havia feito dominante sob a Constituição de Weimar? Em absoluto. Trata-se de uma primeira e radical falsificação interessada. Basta lançar um olhar superficial ao que, naquele tempo, escreviam os juspubli- cistas que de imediato se converteram nos juristas de cabeceira do regime hitlerista para ver que, ainda sob Weimar, sua oposição a Kelsen era te- naz e raivosa. Neohegelianos, jusnaturalistas e decisionistas, todos em sua diversidade achavam-se unidos na crítica a Kelsen. Seguramente é lícito afirmar com a maior contundência que nem um só kelseniano dos tempos da República passou às fileiras de Hitler mantendo a doutrina originária. Nem um. Dessa maneira, como podemos entender que tantos professores antikelsenianos argumentassem, depois de 1945 ou de 1949, que sempre haviam estado eclipsados por Kelsen e que só agora, naquele momento, al que no tardarían en acudir las fuerzas que terminarían con el sueño de Weimar. Persiguiendo lo sublime, Triepel y tantos otros allanaron el camino a la barbarie” (REQUEJO PAGÉS in KELSEN, 2006, pp. 18-19). 12 Ao mencionar estes únicos representantes do positivismo em tempos de Weimar, Stanley Paulson assinala que justa- mente eles eram os defensores do Estado de Direito que se queria construir com a Constituição de Weimar, enquanto os críticos mais ácidos do regime constitucional e democrático eram antiliberais e neohegelianos como Carl Schmitt, Julius Binder ou Karl Larenz, entre muitos outros (PAULSON, 1994, p. 325). Os juspositivisntas citados por Paulson tinham em comum com Kelsen sua condição de democratas e de ter escrito, a maioria deles, obras importantes sobre teoria democrática. Além disso, três – Kelsen, Walter Jellinek e Nawiaski – sofreram repressão acadêmica por serem judeus. Quanto aos outros, Anschütz se aposentou voluntariamente com a chegada dos nazistas ao poder e foi objeto de agressões em revistas nacional-socialistas. Thoma continuou em sua cátedra, mas sem ter nunca tomado partido pelo novo regime (PAULSON, 1994, p. 345 et seq. ).
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