Revista da EMERJ - V. 21 - N. 2 - Maio/Agosto - 2019
R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 21, n. 2, p. 238-262, Maio-Agosto, 2019 244 decisões e vontades ser levadas em consideração como expressão, de fato, dos direitos fundamentais do cidadão contra os poderes do Estado. Percebe-se que a dignidade é totalmente inseparável da autonomia 11 para o exercício da razão prática, e é por esse motivo que apenas os seres humanos revestem-se de dignidade. Para Kant, todos os seres humanos gozam dessa autonomia, uma vez que a condição de ser humano é suporte necessário e sustentáculo da dignidade, ou seja, o que faz do homem um fim em si mesmo. Diante disso, em uma análise mais concreta, há que se considerar a variação da noção de cada indivíduo para uma vida digna, suscetível às mudanças, de acordo com suas necessidades e desejos. Na situação do usuário de qualquer serviço de saúde, as máximas de liberdade e autonomia fazem com que a pessoa possa e deva questionar métodos e motivos dos tratamentos aos quais é submetida, além de poder optar pela forma como acontecerá seu atendimento. É verdade que a autonomia encontrará seus limites. A circunstância em que se encontra o indivíduo, por exemplo, em caso de ameaça ou coa- ção, deve ser avaliada de modo a verificar se a sua vontade está impregnada de vício. A pessoa que procura o serviço de saúde o faz desejando que seu elemento de vontade, elemento este subjetivo, seja o núcleo sob o qual gira em torno todo o seu tratamento. Estamos falando da autonomia pessoal que, sem dúvidas, para sua efetivação, depende de elementos externos e alheios à vontade do indivíduo. Nesse contexto, diversas situações podem impedir o indivíduo inserido na sociedade de exercer sua autonomia em plenitude. Nasce o conflito quando o Poder Público deixa de promover ações capazes de assegurar o cumprimento dos direitos fundamentais de modo a não infringi-los. Destarte, quando se trata da violação à autonomia pessoal, esta pode não ser percebida aos olhos da sociedade e do Poder Público, uma vez que estamos lidando com a esfera subjetiva do indivíduo, seus dese- jos mais íntimos, que nem sempre são compreendidos pelas pessoas que o cercam. De outro lado, há que se considerar que é gritante, não passa despercebida e exige uma resposta imediata do Poder Público, a violação à autonomia física do paciente inserido em um contexto onde não se aplicam da melhor forma os recursos destinados à saúde por parte do 11 KANT, Immanuel Kant, Fundamentação da metafísica dos costumes , 2004, p. 79.
Made with FlippingBook
RkJQdWJsaXNoZXIy NTgyODMz