Revista da EMERJ - V. 21 - N. 2 - Maio/Agosto - 2019
R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 21, n. 2, p. 238-262, Maio-Agosto, 2019 243 ordenamento jurídico encontra seu fundamento no segundo elemento, a autonomia 8 . Neste estudo, a autonomia ocupa posição estratégica quando se fala do tratamento fornecido ao usuário do serviço de saúde, visto que a assistência a estes pacientes está pautada na implementação de ações terapêuticas e de reabilitação, direcionadas à ideia de promoção à saúde e qualidade de vida, com o objetivo de incentivar e ampliar a independência dos sujeitos na gestão da vida e no resgate da cidadania. 2.1 A autonomia enquanto direito fundamental Grandes filósofos como John Locke, Immanuel Kant e Stuart Mill destacam a importância da liberdade para a vida política e o crescimento pessoal. Desse ideal surgiu o princípio da autonomia, baseado no respeito às pessoas, o qual parte da liberdade que exige que aceitemos que elas se autogovernem e sejam autônomas nas suas escolhas e nos seus atos. Kant coloca a autonomia como fundamento da dignidade da pessoa humana, ao dizer que “[...] os seres racionais chamam-se pessoas porque a sua natureza os diferencia como fins em si mesmos, isto é, como algo que não pode ser usado somente como meio, e, portanto, limita nesse sentido todo capricho e é objeto de respeito”. Se o Estado de Direito e a democracia dizem respeito à compreen- são da liberdade, este valor, visto sob a dimensão que se relaciona ao status das pessoas, 9 deve ser avaliado sob a perspectiva da liberdade-autonomia. No Estado Democrático de Direito, o direito à autonomia deve oferecer ao indivíduo o reconhecimento do domínio sobre a sua própria vida, per- mitindo-o buscar o seu ideal de viver bem e de ter uma vida boa 10 . Dessa ideia, preserva-se o respeito à intimidade, de modo a limitar a intromissão dos outros indivíduos no mundo da pessoa que esteja ou não sob cuida- dos, preservando sua própria saúde e seu poder de escolha, devendo suas 8 As principais dificuldades dos pacientes estão relacionadas com a perda da autonomia para a vida cotidiana, a ausência de rede social de apoio, alta dependência de outras pessoas, sobrecarga familiar, dificuldades laborais, problemas relacionados com estigma e dependência econômica. A implementação desses serviços traça uma trajetória preparando o paciente para ir avançando em sua autonomia e independência até lograr sua inserção comunitária. 9 PECES-BARBA, Gregório. Los valores superiores . Madrid: Tecnos, 1984, p. 135-138. O autor, ao dizer que igualdade e liberdade não se compreendem separadas, sustenta que a liberdade tem duas grandes dimensões: organizativa e outra que se relaciona ao status das pessoas na organização social. 10 BARROSO, Luís Roberto. A dignidade da pessoa humana no direito constitucional contemporâneo: a construção de um conceito jurídico à luz da jurisprudência mundial . Belo Horizonte: Fórum, 2014, p. 81.
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