Revista da EMERJ - V. 21 - N. 2 - Maio/Agosto - 2019

 R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 21, n. 2, p. 216-237, Maio-Agosto, 2019  219 minação sumária de pessoas com deficiência, ainda que prevalecesse a relação entre pecado e deficiência. Durante a Idade Média, o recurso às ex- planações religiosas tornou-se mais relevante e tomou força. No período áureo do poder da Igreja, a imposições de seus dogmas não se adstringia apenas a persuasão, não raro fazendo-se por intermédio da força física. Mantendo o caráter de fenômeno metafísico ou espiritual, durante a Inquisição, a partir do século XIII, lastreando-se na ideia de que os sinais de malformações físicas e de deficiência mental eram resultado da união entre mulher e o demônio, passando a ser considerados como “bestas demoníacas” 9 , crianças e mulheres foram vitimados por açoites, por alge- mas e pela fogueira. Com o advento da Revolução Burguesa, no final do século XV e início do século XVI, propiciou-se uma mudança na concepção de ho- mem, de sociedade e do mundo, e também de deficiência, que passou a ter uma conotação mais estreitada com o mundo que se construía voltado para a produção e o capital, em vinculação direta ao sistema econômico, passando a avaliar as pessoas com deficiência de acordo com a capacidade produtiva que o indivíduo demonstrasse 10 . No cavalgar do século XVI, ensina-nos Raimundo José Pereira 11 que a deficiência clamou atenção daqueles que se colocaram a pensá-la para além das justificativas sobrenaturais, influenciados pelas ideias de Isa- ac Newton e uma visão mecanicista de universo. Passou-se a entender o corpo como uma máquina, e a deficiência, assim como uma excepcionali- dade ou diferença, era entendida como uma disfunção num componente dessa máquina. Assenta-se que desde então a deficiência tem sido entendida, deficiência assim como revestia-se de misticidade, encampavam papéis úteis, como os de servir como guia na escuridão e como memorizadores e transmissores de tradições tribais e religiosas, sendo ainda reverenciados como profetas e adivi- nhos. In: TELFORD, Charles; SAWREY, JAMES. O indivíduo excepcional . Rio de Janeiro: Editora Guanabara, 1977. p 467-8. 9 CAVALCANTE, Fátima. Pessoas muito especiais: a construção social do portador de deficiência e a reinvenção da família. Rio de Janeiro. 2002. 393 p. Tese (Doutorado em Saúde Pública) – Escola Nacional de Saúde Pública/Fundação Oswaldo Cruz. p. 144. 10 SIVA, Nara Liana Pereira; DESSEN, Maria Auxiliadora. Deficiência Mental e Família : implicações para o desenvolvimento da criança. Psicologia: Teoria e Pesquisa. v. 17, n. 2, p. 133-141, mai./ago. 2001. p. 134. 11 PEREIRA, Raimundo José. Anatomia da diferença: uma investigação teórico-descritiva da deficiência à luz do cotidiano. Rio de janeiro. 2006. 174 p. Tese (Doutorado em Saúde Pública) – Escola Nacional de Saúde Pública/Fundação Oswaldo Cruz. p. 20.

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