Revista da EMERJ - V. 21 - N. 2 - Maio/Agosto - 2019

 R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 21, n. 2, p. 181-215, Maio-Agosto, 2019  208 – que lhe é acidental –, o processo não subsiste sem a prática dos atos processuais típicos , que atuam como verdadeiros átomos daquele habitat ou todo maior. Para o estudo da “ação anulatória” não interessam os atos proces- suais típicos. Sua análise é de obiter dictum . O art. 966, §4º, CPC, reclama a compreensão do ato processualizado, porquanto observa a essência do ato ou negócio jurídico do direito material, cotejando-o perante o sistema de nulidades do direito material. O ato processualizado é o objeto 59 da “ação anulatória”. A internalização de um ato ou negócio do direito material no pro- cedimento é efetuada por um ato processual típico, um ato de “processu- alização” (procedimentalização). Geralmente, esse ato processual de inter- nalização apenas encobre negócio jurídico do direito material e o conjunto disso resulta no ato processualizado – ato ou negócio subjacente + ato processual típico –, e assim retira a necessidade do contraditório e abrevia ou elastece a solução da causa 60 . O ato processualizado encerra uma solução do objeto do processo por intermédio da autocomposição. Até certo ponto é verídica a regra ge- ral que identifica o ato processualizado com a disposição do direito, o que está muito bem estabelecido no art. 966, §4º, do CPC. À doutrina, cabe sedimentar os contornos do ato processualizado, sua fonte normativa, es- 59 A noção é fundamental: no plano do direito material, são analisados os atos e negócios jurídicos praticados pelas partes. Tais fenômenos de direito material, pela função que desempenham no processo, são trazidos para o interior do procedimento. O link de conexão entre o plano material e o processo se realiza por um ato processual típico e geral- mente transparente, responsável pela colocação daqueles atos e negócios no interior do processo. Daí resulta a aparente confusão: sempre haverá um ato processual típico – seja ele bem visível, ou transparente em termos de efeitos, como na grande maioria das hipóteses, porque esses últimos possuem a singela finalidade de internalizar o ato ou o negócio jurídico praticado pelas partes no plano do direito material. 60 Serem “irrelevantes ao atingimento da eventual atividade decisória” significa que os atos processualizados abreviam o processo. O ato processualizado abrevia uma latente ou evidente litigiosidade, que seria pressuposta da decisão, do julgamento, consoante será analisado. Daí referir que a essência do objeto da ação anulatória é um ato regulamentado pelo direito material: basta observar a transação, a renúncia o direito, o reconhecimento do pedido – situações que extinguem o processo, mas não exigem o julgamento do mérito, apesar de “resolverem” o mérito. Parece açodada a referência de José Rubens Costa quando escreve que “atos da parte expostos à ação anulatória serão todos os que não conduzam à solução de qualquer conflito, os praticados na jurisdição voluntária, no processo cautelar, os de desistência da ação de conheci- mento ou de execução, os de substituição de tutores, curadores, arrematação, adjudicação, remição, etc.” Com efeito, diz o ditado que “o que não tem solução, solucionado está” – ou seja, o ato processualizado não retira a solução do processo, entretanto, abrevia a solução, arrefecendo o contraditório e de alguma forma, na prática, correspondendo a uma dispo- sição do processo e da necessidade de uma decisão e da coisa julgada. Afinal, o ato processualizado é um “ato jurídico perfeito” e isso tem a mesma envergadura de direito fundamental equivalente à coisa julgada. Ver Ação desconstitutiva de ato processual, Revista Forense , n. 383, p. 194.

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