Revista da EMERJ - V. 21 - N. 2 - Maio/Agosto - 2019
R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 21, n. 2, p. 52-118, Maio-Agosto, 2019 108 Kelsen entende que todos esses princípios e direitos expressam o que comumente se identifica com o liberalismo político, o que pode ser interpretado enquanto uma declaração – relativa e condicionada – das pre- ferências políticas de Kelsen: Es de la mayor importancia tener en cuenta que la transforma- ción de la idea de libertad natural, como ausencia de gobierno, en la idea de libertad política, como participación en el gobierno, no implica un completo abandono de la primera. Lo que de ella permanece es el principio de una cierta restricción del poder de gobierno que es el principio fundamental del liberalismo políti- co. La democracia moderna no puede separarse del liberalismo político. El principio básico de éste es que el gobierno no debe interferir en ciertas esferas de intereses del individuo, que deben ser protegidos por la ley como derechos o libertades humanas fundamentales. El respeto a estos derechos salvaguarda a las mi- norías contra el dominio arbitrario de las mayorías. 143 Essa simpatia de Kelsen pelo liberalismo exige certos esclarecimen- tos. Em primeiro lugar, tal se mostra enquanto consequência da opção de Kelsen pelo individualismo, o qual, por sua vez, deriva da recusa de qualquer possibilidade de justificação racional da existência de realidades supra individuais e do papel que a liberdade individual desempenha em sua doutrina. Kelsen faz uma interpretação do liberalismo que se encaixa em seus postulados fundamentadores do direito entendido como instituição a serviço da liberdade. Ele aduz que, à diferença do anarquismo, 144 já que para o liberalismo la coacción estatal es inevitable (considerada como vinculación jurídica), la libertad no puede consistir más que en la autovin- culación, en la autodeterminación de quienes han de ser jurídi- 143 KELSEN, 1988b, p. 243. 144 Poderia se pensar que o anarquismo é a postura que melhor se adequa à importância que Kelsen concede à liberdade e ao indivíduo. O dado crucial que o leva a se inclinar em favor do liberalismo e a rechaçar o anarquismo político é sua concepção da natureza humana. O anarquismo pressupõe um ser humano bom por natureza e não egoísta. Assim, se os indivíduos vivessem sem coação, da bondade natural surgiria uma convivência espontaneamente justa e respeitosa. Por seu turno, o liberalismo assenta-se sobre a necessidade da coação – ainda que mínima –, dado que não compartilha de tal visão idílica do humano. Cf. KELSEN, 1979c, pp. 40-41.
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