Revista da EMERJ - V. 21 - N. 1 - Janeiro/Abril - 2019

 R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 21, n. 1, p. 19 - 31, Janeiro-Abril. 2019  23 3. O NASCITURO NO DIREITO BRASILEIRO O ordenamento jurídico brasileiro, na verdade, tem uma interpreta- ção sistemática e evolutiva do texto constitucional e dos demais dispositi- vos infraconstitucionais que obriga a concluir que ao ser humano, desde sua concepção , devem ser assegurados o direito à vida, à saúde, à alimen- tação, à educação, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária. A proteção se estende, igualmente, a qualquer ne- gligência, discriminação, violência, crueldade e opressão. O Código Civil brasileiro, no artigo 2º, dispõe que a personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida, sendo certo que a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro. Observa-se que o referido dispositivo legal não contemplou os re- quisitos da viabilidade (permanência da vida no recém-nascido), como o faz o Direito Civil Holandês e o Francês, e a forma humana, esta última que era exigida pelo Direito Civil Espanhol (artigo 30º) 18 . Não obstante os autores divirjam quanto às correntes de pensamen- to citadas, o cerne da questão, na verdade, não está mais em qual teoria adotar, uma vez que a maioria dos doutrinadores modernos e a jurispru- dência brasileira consideram que há direitos que devem ser conferidos ao concebido, ao menos no plano dos diretos da personalidade 19 . Traçando, no entanto, um paralelo entre a ideia supracitada, per- cebe-se que a doutrina brasileira se aproxima do que é proposto pela teoria que se convencionou chamar de personalidade condicional, pois a personalidade do nascituro conferiria aptidão apenas para a titulari- dade de direitos personalíssimos (sem conteúdo patrimonial), como exemplo, o direito à vida ou a uma gestação saudável, uma vez que os direitos patrimoniais estariam sujeitos ao nascimento com vida (con- dição suspensiva). 18 Vide , neste sentido, Maria Helena Diniz, Curso de Direito Civil Brasileiro ..., op.cit, pp. 231-232. 19 De qualquer forma, César Fiúza, lembrado por Flávio Tartuce, critica a redação do artigo 2º do atual Código Civil Brasileiro: “Perdeu o legislador a oportunidade histórica de pôr fim à controvérsia entre natalistas e concepcionistas. Os natalistas entendem que a personalidade tem início com o nascimento com vida. Os concepcionistas defendem a tese de que a personalidade começa a partir da concepção. Qual seria a posição do Código Civil? Os natalistas propugnam por sua tese; afinal, esta seria a intenção literal do legislador, ao afirmar que a personalidade civil começa do nascimento com vida. Ocorre que, logo a seguir, o mesmo legislador dispõe que os direitos do nascituro serão postos a salvo. Direitos só detém as pessoas, sendo assim, por interpretação lógica, o texto legal estaria adotando a tese concepcionista. Faltou coragem ao legislador de 2002 (Código Civil anotado...., 2004, p. 24).” (Flávio Tartuce, Direito Civil Lei de Introdução e Parte Geral. v.I, 12ª ed., revista, atualizada e ampliada, gen/Forense, Rio de Janeiro, 2016, pp. 118-119).

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