Revista da EMERJ - V. 21 - N. 1 - Janeiro/Abril - 2019
R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 21, n. 1, p. 135 - 154, Janeiro-Abril. 2019 149 O segundo requisito para aplicação dos precedentes é a identidade objetiva entre o precedente e o caso atual. 33 Tal como ocorre com os pre- cedentes judiciais, a aplicação dos precedentes administrativos pressupõe semelhanças entre o caso anterior e o atual. A semelhança entre os fatos envolvidos no precedente administrativo e no caso atual justifica a neces- sidade de aplicação da mesma solução jurídica. Dessa forma, ao julgar o caso atual, o administrador público deverá utilizar a mesma ratio decidendi ou ( holding ) do precedente, garantindo a coerência administrativa e, em última análise, a segurança jurídica e a isonomia. O caráter vinculante dos precedentes administrativos é retirado do motivo e do conteúdo da decisão administrativa, devendo ser adotada a mesma ratio decidendi em casos futuros e semelhantes. 34 A ratio decidendi é a regra de direito ou o princípio jurídico extraído da fundamentação, a partir dos fatos envolvidos na questão, e necessária para decisão. Por outro lado, a obiter dictum (no plural, obter dicta ), a partir de uma noção negativa ou excludente, pode ser considerada como a parte da decisão que não corres- ponde à ratio decidendi , referindo-se, portanto, aos argumentos e opiniões que não foram essenciais para a decisão do caso e que não vincularão os julgamentos futuros. O terceiro requisito para a caracterização do precedente é a sua legalidade. Seria desproporcional imaginar que precedentes ilegais ou in- constitucionais fossem perpetuados na Administração Pública, sem a pos- sibilidade de sua correção ou superação pela própria Administração. Trata- se da autotutela administrativa que estabelece o dever da Administração de anular, por ilegalidade, e a faculdade de revogar, por conveniência e opor- tunidade, seus próprios atos administrativos (art. 53 da Lei 9.784/1999 e Súmula 473 do STF). Registre-se, contudo, que a anulação do precedente administrativo ilegal possui efeitos retroativos ( ex tunc ), ressalvada a possi- bilidade excepcional de modulação dos efeitos temporais na decisão pro- 33 DÍEZ-PICAZO, Luis Ma. La doctrina del precedente administrativo. In: Revista de Administración Pública (RAP), Marid, nº 98, May.-ago., 1982, p. 21. 34 A definição da parte vinculante do precedente judicial é uma das tarefas mais complexas da teoria dos precedentes. Na doutrina norte-americana, foram desenvolvidos dois testes tradicionais para identificação da ratio decidendi: a) teste de Wambaugh: a ratio decidendi seria uma regra jurídica sem a qual o magistrado teria decidido de forma diferente; e b) teste de Goodhart: a ratio decidendi (denominada pelo autor como principle of a case ) é determinada a partir dos fatos materiais que são considerados fundamentais pelo magistrado para decisão do caso. WAMBAUGH, Eugene. The Study of Cases: a course of instruction in reading, stating reported cases, composing head-notes and briefs, criticizing and comparing authorities, and compiling digests , 2 ed., Boston: Little, Brown and Company, 1894, p. 17; GOODHART, Arthur L., Determining the Ratio Decidendi of a Case. In: Yale Law Journal , v. XL, n. 2, dec. 1930, p. 161-183.
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