Revista da EMERJ - V. 20 - N. 3 - Setembro/Dezembro - 2018
R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 20, n. 3, p. 88 - 114, Setembro - Dezembro. 2018 88 O Ataque às 10 Medidas e à Lava Jato Deltan Dallagnol Procurador da República, coordenador da força-tarefa da Operação Lava Jato. Capítulo 8 do livro “A luta contra a corrupção – a Lava Jato e o fu- turo de um país marcado pela impunidade”, Primeira Pessoa - 2017 O dia seguinte Na manhã de 30 de novembro, acordei atordoado. Era a terceira noite em que dormia mal. O chão tinha sumido debaixo dos meus pés. A madrugada tinha sido terrível. O plenário da Câmara dos Deputados havia dilacerado as 10 Medidas e ido além: desferira um duro golpe contra a Operação Lava Jato. Era como se eu estivesse de ressaca, mas precisava encontrar forças para ler os textos aprovados, cada destaque e cada emen- da que haviam desfigurado o pacote anticorrupção. Era urgente entender a abrangência do ato de vingança contra a independência do Ministério Público e do Poder Judiciário. O sentimento era de que tudo tinha sido em vão. Sem mudanças no sistema político e de Justiça Criminal, a Lava Jato de nada teria adiantado. Ainda assim, era necessário juntar os cacos da esperança que me mantivera firme ao longo dos últimos dois anos e meio e ir para a sede da força-tarefa. Perto das 10 da manhã, havia uma reunião marcada para tentar fechar o acordo de colaboração com a Odebrecht. A iminência desse acordo era o pano de fundo de tudo que vinha acontecendo nas últimas três semanas. A empreiteira tinha sido uma das maiores doadoras de campanhas eleitorais. Mas isso, mais uma vez, era apenas a ponta do iceberg. Por debaixo dos panos, um departamento espe- cífico para pagamentos ilícitos, o chamado Setor de Operações Estrutura- das, pagava centenas de milhões em propina para uma grande quantidade de políticos do mais alto escalão. Circularam pelo departamento, segundo
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