Revista da EMERJ - V. 20 - N. 3 - Setembro/Dezembro - 2018
R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 20, n. 3, p. 70 - 87, Setembro-Dezembro. 2018 76 fícios. Entramos no campo da consensualidade, que já se deve situar entre os novos paradigmas conformadores da gestão pública no estado demo- crático de direito. Resultado de interesse público legítimo é aquele que a população destinatária reconhece como tal, por atender a suas prioritárias necessidades do mínimo existencial. Exemplifica-se. As partes do processo nº 2004.001.17.929, que tra- mitou na Justiça do Estado do Rio de Janeiro, interpuseram recurso de ape- lação contra sentença que julgara improcedente pedido para compelir-se concessionária de energia elétrica a dar continuidade a projeto de substituir, em comunidade urbana, a rede aérea e clandestina de distribuição de energia por rede subterrânea. O processo judicial ensejou ampla dilação probatória, vindo aos autos provas e contraprovas periciais, além de depoimentos de testemunhas. Ressaiu comprovado que a concessionária desistira do proje- to, dando-o por encerrado, nada obstante a sua excelência técnica, porque, durante as noites, a comunidade destruía o que a concessionária executava durante o dia. E assim agia a comunidade porque fora convencida por ter- ceiros (os operadores da rede aérea clandestina...) de que a rede subterrânea expunha a risco de morte as crianças que tocassem nas aberturas de visita técnica aos equipamentos subterrâneos. Em outras palavras, a concessio- nária decidira realizar o projeto sem antes esclarecer a comunidade sobre os benefícios e afastar crendices e aventados malefícios que decorreriam da rede subterrânea, solução desconhecida da comunidade, embora de reputa- ção técnica indiscutível (v. nosso Temas de Direito Administrativo sob Tu- tela Judicial, no Estado Democrático Eficiente, p. 44-52. Rio de Janeiro: Ed. Renovar, 2010). Eis a síntese da consensualidade: o índice de êxito de um projeto que interfira nos hábitos da cultura da comunidade que o receberá é tanto maior quanto mais essa comunidade for previamente esclarecida e convencida de que o projeto é de seu interesse. Obtido o consenso, a comu- nidade passa a adotar o projeto como seu e o protegerá e compartilhará sua execução e seu sucesso. Portanto, antes da ação dos técnicos, é imperativa a atuação de agentes comunitários. Não se investe recurso público, sob pena de desperdício, enquanto não houver consenso no seio da população desti- natária do projeto, ainda que este tenha embasamento teórico de indiscutível qualidade. A Lei nº 8.666/93 representou um esforço elogiável de parametriza- ção nacional de normas regentes de licitações e contratos celebrados pela
Made with FlippingBook
RkJQdWJsaXNoZXIy NTgyODMz