Revista da EMERJ - V. 20 - N. 3 - Setembro/Dezembro - 2018

 R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 20, n. 3, p. 24 - 50, Setembro-Dezembro. 2018  37 Têm que se considerar ainda, porque pertinente, as dificuldades decorrentes da tramitação e condução dos processos judiciais sob influxo das diversas reformas processuais civis. Examinando essa matéria, o pro- fessor mineiro José Coelho Nunes Dierle assim se manifestou: Desde o início da década de 1990, um peculiar movimento de acesso à Justiça, além da finalidade alegada – qual seja, a socialização do Direito Processual, permitiu uma série de alterações na legislação e no Direito Pro- cessual que possibilitaram a sobrevalorização da rapidez procedimental e de uma específica concepção funcional (de eficácia). Tais alterações, ao invés de instaurar um modelo social de processo, estabeleceram, em muitas hipóteses de aplicação, o neoliberalismo processual, com a massificação dos julgamen- tos e a redução do processo, em seu aspecto técnico, a mera formalidade, e sua função legitimadora e formadora dos provimentos a mera função legitimante das concepções judiciais que podem corroborar os interesses do mercado ou da Administração 29 . Sem perceber as diferenças entre os três paradigmas processuais ( liberalismo processual 30 , socialização processual do pós-guerra 31 e neoliberalismo pro- cessual brasileiro 32 , e premidos pelo discurso de produtividade e de rapidez 29 DIERLE, José Coelho Nunes. Processo Jurisdicional Democrático – Uma Análise Crítica das Reformas Pro- cessuais . Curitiba: Juruá Editora, 2009, p. 209. 30 DIERLE, José Coelho Nunes, Op. cit. pp. 73-77 – liberalismo processual -Dentre os caracteres do processo liberal o autor destaca: a igualdade formal dos cidadãos; a escritura (o juiz devia julgar apenas com base nos escritos, nunca em contato direto com as partes, com as testemunhas, com os peritos, para evitar as tentações e os perigos da imparcialidade) e o princípio dispositivo que compreende o protagonismo processual das partes a quem eram confiados: a proposição, onde era fixado o objeto do juízo, e o impulso processual, estando o juiz vinculado à iniciativa das partes. 31DIERLE, José Coelho Nunes, pp. 79-115 – socialização processual - A partir do início do séc. XX, como crítica à logica liberal, são propostas alterações profundas no sistema de administração da justiça civil visando a socialização processual. Nesse paradigma temos o protagonismo do juiz que deveria dirigir o processo e estabelecer um equilíbrio entre as partes, podendo ter iniciativa quanto a produção de provas. Sob esse influxo foram aprovados os Códigos de Processo Civil de 1939 e de 1973. Desse ano até 1978 foi levado a cabo, sob o patrocínio da Fundação Ford, o Projeto Florença de Acesso à Justiça, que envolveu representantes de 23 países. Suas tônicas eram a defesa dos procedimentos orais e o aumento da ingerência do juiz no processo, devendo as conclusões serem implementadas por ondas. A primeira, a assistência jurídica integral e gratuita; a segunda, a efetiva tutela dos interesses difusos ou coletivos para a proteção do consumidor e do meio ambiente e a terceira, a simplificação dos procedimentos e a utilização de formas privadas ou informais de solução de conflitos. 32 DIERLE, José Coelho Nunes – pp. 158-169 - neoliberalismo processual - A partir dos anos de 1990, com a implan- tação do neoliberalismo pelos governos Fernando Henrique e Collor, pelas vozes de suas equipes econômicas, passou a ser defendida a não interferência da jurisdição nos contratos financeiros, sob pena de se criar um risco ou “incerteza ju- risdicional”. Vozes da teoria econômica passaram a defender reformas processuais que reduzissem a função fiscalizadora e construtora do Judiciário, tendo por base o Documento Técnico 319 do Banco Mundial intitulado “O Setor Judiciário na América Latina e no Caribe”. O modelo de reforma pretendido deveria assegurar uma uniformidade decisional que não levaria em consideração as peculiaridades do caso concreto, mas asseguraria alta produtividade decisória, de modo a assegurar os critérios de excelência e de eficiência requeridos pelo mercado financeiro; a defesa da máxima sumarização da cognição, com redução do espaço discursivo processual.

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