Revista da EMERJ - V. 20 - N. 3 - Setembro/Dezembro - 2018

 R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 20, n. 3, p. 344 - 368, Setembro - Dezembro. 2018  364 Dessa forma, a interpretação de determinada norma deve ser feita em conjunto com as demais, uma vez que a interpretação de um mero inciso fora do contexto pode criar uma anomalia jurídica. Neste sentido, transcreve-se trecho da Professora Evy Cynthia Marques: “Converge para esta conclusão a leitura das demais normas contidas do art. 5º relacionadas à associação. O inciso XXI do art. 5º da CCF, por exemplo, determina que 'as entidades as- sociativas, quando expressamente autorizadas, têm legitimidade para representar seus filiados judicial ou extrajudicialmente'. Tal norma aplica-se apenas ás associações. Os sócios das sociedades não podem ser representados, em suas demandas judiciais, pela sociedade. Importante também notar que, nas diversas vezes em que o constituinte quis se referir à sociedade, empregou os ter- mos 'sociedade', 'empresa' ou 'companhia', e não 'associação', previsto no inciso XX do art. 5º da CF, não se refere à socieda- de”. (MARQUES, 2011, p. 130) Ad argumentandum tantum , se optássemos pela aplicabilidade do inci- so XX às sociedades, chegar-se-ia à conclusão de que qualquer sócio teria o direito potestativo de se retirar da sociedade, a qualquer tempo, median- te simples exercício de vontade e com a consequente dissolução parcial da pessoa jurídica. Neste sentido, explica o Professor Fábio Ulhoa Coelho: “A liberdade de associação é irrestrita no momento da constitui- ção da sociedade empresária ou do ingresso na constituída, não podendo ninguém ser obrigado a se tornar sócio de sociedade contratual contra a vontade. Uma vez, porém, ingressando na sociedade empresária, o sócio não poderá dela se desligar senão nas hipóteses previstas em lei”. (COELHO, 2012. p. 78) Daí, conclui-se que a aplicação da dignidade da pessoa humana e da liberdade de associação como fundamentos para a dissolução parcial de sociedade caracteriza fenômeno descrito pelo Ministro Luis Roberto Barroso como “ constitucionalização excessiva ”. Trata-se do uso abusivo da discricionariedade judicial quando da aplicação de conceitos jurídicos in- determinados – ou princípios de conteúdo fluido – na solução de casos complexos:

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