Revista da EMERJ - V. 20 - N. 3 - Setembro/Dezembro - 2018
R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 20, n. 3, p. 344 - 368, Setembro - Dezembro. 2018 359 A matéria, na órbita empresarial, é de natureza técnica e, por isso mesmo, não pode ser vista como compreendida no âmbito do direito de se filiar a uma associação ou dela se desfiliar. A subscrição ou aquisição de cotas ou ações consubstancia um negócio – é objetiva. A filiação a uma associação é de natureza pessoal – é subjetiva, e traz a conotação da integração em um ideário, seja este de que natureza for (político, religioso, esporti- vo ou de mera convivência social). Ademais, o entendimento de que a liberdade de desfiliação seria aplicável às sociedades em geral conduziria o intérprete a uma manifesta e irrecusável impropriedade, pois permitiria entender que qualquer acionista, de sociedade grande ou pequena, fecha- da ou aberta, poderia exercer, a qualquer tempo, esse direito de desfiliação, assim obtendo a liquidação parcial da sociedade. Tal entendimento golpearia de forma catastrófica a ordem econô- mica, pois desestabilizaria as companhias e, ao mesmo tempo, comprometeria o mercado de capitais, cuja base de sustentação é o propósito de permanência que provém da continuidade e da longevidade das empresas. Acrescente-se que a aplicação às sociedades das regras constitu- cionais sobre associação conduziria ainda o intérprete a diversos outros efeitos impróprios, tais como: a) considerar inconstitu- cionais as normas sobre intervenção e liquidação extrajudicial de instituições financeiras (art. 5º, XIX, da Constituição Federal); e b) considerar também inconstitucionais as normas que impõem a autorização do governo para o funcionamento de instituições financeiras, seguradoras e outras empresas com atividades es- pecialmente sensíveis (art. 5º, XVIII, da Constituição Federal). A extravagância desses efeitos – especialmente do direito amplo e imotivado de se retirar de qualquer sociedade -, também atua no sentido de demonstrar que os incisos XVII, XVIII, XIX, XX e XXI do art. 5º da Constituição Federal alcançam apenas as associações, uma vez que o Direito deve “ser interpretado inteligentemente: não de modo que a ordem legal envolva um absurdo, prescreva inconveniências, vá ter a conclusões incon- sistentes ou impossíveis”, como bem exposto na clássica lição
Made with FlippingBook
RkJQdWJsaXNoZXIy NTgyODMz