Revista da EMERJ - V. 20 - N. 3 - Setembro/Dezembro - 2018
R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 20, n. 3, p. 296 - 318, Setembro - Dezembro. 2018 314 O republicanismo projeta um ideal ambicioso para a política. Dese- ja-se que a política – compreendida em sentido amplo – tenha importância para as pessoas, que não devem limitar as suas atividades e atenção aos seus interesses e negócios privados. 50 Ademais, espera-se que a política não se resuma à disputa entre forças movidas por interesses egoísticos, mas se volte à busca coletiva do bem comum. Nessa chave, a esfera pública é ide- almente concebida não como algo similar ao mercado – em que os agentes visam apenas a defender os próprios interesses –, mas como um fórum, em que existe disputa, mas também troca de razões e argumentos objeti- vando a identificação e persecução do interesse público. 51 Não se afirma que essa seja a realidade da política nas sociedades contemporâneas. Trata- -se, isso sim, do ideal normativo a ser perseguido para a construção do Estado republicano. Por isso, a lógica republicana não se contenta com a garantia de li- berdades e de direitos políticos, que o cidadão pode exercer se quiser. Ela é mais exigente, pois almeja fomentar o engajamento político-social das pes- soas e o desenvolvimento de virtudes cívicas entre cidadãos. 52 Sem descu- rar dos direitos, a república também enfatiza o papel dos deveres. Dentre eles, destaca a obrigação política de o cidadão se interessar pela construção dos destinos de sua comunidade e de participar desta empreitada coletiva. Como salientou Bresser-Pereira “ o Estado republicano é um sistema de governo que conta com cidadãos engajados que participam do governo juntamente com políticos e servidores públicos ”. 53 Essa lógica republicana foi em boa parte acolhida pela Constituição de 88. Daí, por exemplo, a decisão do constituinte de, além de garantir a todo cidadão o direito à propositura de ação popular para a tutela da coisa pública, isentar o autor dessas demandas das custas judiciais e dos ônus da sucumbência, salvo o caso de comprovada má-fé (art. 5º, LXXIII). A pre- visão indica a clara intenção constitucional de estimular o uso dessa ação, que representa típico instrumento processual de participação republicana. Daí também a opção pelo voto obrigatório (art. 14, §3), que desvela a com- 50 Cf., e.g., Hannah Arendt. “Freedom and Politics”. In: David Miller (Ed.). The Liberty Reader. Op. cit., p. 58-80. 51 Cf., e.g., Rainer Forst. “The Rule of Reasons: Three Models of Deliberative Democracy”. Ratio Juris, v. 4, n.4, 2001. 52 Cf. Paulo Ferreira da Cunha. Da constituição antiga à constituição moderna: república e virtude. Revista Brasileira de Estudos Constitucionais, n. 5, v.2, 2008. 53 Luiz Carlos Bresser-Pereira. Construindo o Estado Republicano: democracia e reforma da gestão pública. Rio de Janeiro: FGV, 2009, p. 165.
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