Revista da EMERJ - V. 20 - N. 3 - Setembro/Dezembro - 2018

 R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 20, n. 3, p. 296 - 318, Setembro - Dezembro. 2018  311 O texto constitucional é pródigo em normas voltadas a assegurar essas ideias: os princípios da impessoalidade, moralidade e publicidade ad- ministrativas (art. 37, caput ); a obrigatoriedade de realização de concursos públicos para investidura em cargo ou emprego público (art. 37, II), e de licitações para a celebração de contratos administrativos (art. 37, XXI); o dever de prestação de contas de todos os que utilizem, guardem, geren- ciem ou administrem bens e recursos públicos (art. 70, Parágrafo único). Algumas são tão óbvias, como a vedação de que a publicidade dos órgãos públicos se volte à promoção pessoal de autoridades (art. 37, §1º, CF), que só se explicam pelo temor – fundado, diga-se de passagem – diante da persistência das nossas tradições patrimonialistas. A impessoalidade envolve o dever estatal de atuar de forma impar- cial na gestão da coisa pública, sem que as autoridades favoreçam seus asseclas ou os poderosos, ou prejudiquem desafetos ou grupos vulnerá- veis. Apesar da plena vigência do princípio, a prática do nepotismo, com ele francamente incompatível, persistiu no Brasil por bastante tempo após a promulgação da Carta de 88. Em boa hora, o STF reconheceu que o nepotismo não se compatibiliza com a Constituição, e que a sua proibição pode ser diretamente extraída de princípios constitucionais como a impes- soalidade, a moralidade administrativa e a própria república. 40 A ideia de separação do público e do privado alimentou também uma das mais importantes decisões da história do Supremo, que envolveu a proibição do financiamento empresarial de campanhas políticas. 41 Na prática, essas doações permitiam a infiltração excessiva do poder econô- mico na política brasileira, gerando relações altamente promíscuas entre empresas e candidatos, amplamente documentadas. Além disso, elas con- tribuíam para tornar mais desigual a nossa esfera eleitoral, por favorece- rem o poder dos eleitores e das forças políticas com mais recursos, em 40 STF. ADC 12, Tribunal Pleno, Rel. Min. Ayres Britto, DJe 18.12.2009. Tal decisão voltou-se contra o nepotismo no âmbito do Poder Judiciário. Posteriormente, o STF explicitou a vedação dessa prática em todos os poderes e entidade federativas, por meio da edição da Súmula Vinculante nº 12. 41 Em conjunto com Cláudio Pereira de Souza Neto, fui o autor da representação ao Conselho Federal da OAB que resul- tou no ajuizamento da ADI 4.650, que tratou da matéria. O texto da representação, reproduzido integralmente na petição inicial da OAB, encontra-se em Daniel Sarmento. "Representação ao Conselho Federal da OAB visando ao ajuizamento de ADI contra o financiamento empresarial de campanhas eleitorais". In: Direitos, Democracia e República: Escritos de Direito Constitucional. Belo Horizonte: Fórum, 2018, p. 497-518. Tratei também do tema em Daniel Sarmento e Aline Osório. "Uma Mistura Tóxica: política, dinheiro e o financiamento das eleições". In: Direitos, Democracia e República: Escritos de Direito Constitucional. Op. cit., p. 113-138.

RkJQdWJsaXNoZXIy NTgyODMz