Revista da EMERJ - V. 20 - N. 3 - Setembro/Dezembro - 2018

 R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 20, n. 3, p. 296 - 318, Setembro - Dezembro. 2018  304 Na República, deve se dar o oposto. Os governantes respondem plenamente pelos seus atos e devem ser passíveis de responsabilização pelas irregularidades que cometam. O poder de que desfrutam não é razão para isentá-los de responsabilidade, mas, ao contrário, justifica a plena in- cidência dos instrumentos competentes de responsabilização. 19 Afinal, se a res publica pertence à coletividade e não aos governantes e autoridades, a responsabilidade desses deve ser reforçada pelo fato de que cuidam do que não é deles próprios, mas de todo o povo. Além disso, a responsabilidade dos governantes e agentes públicos significa também que eles não devem desfrutar de privilégios no tocante à responsabilização pelos atos ilícitos que porventura perpetrem, e que não guardem relação com o poder que exerçam. O fundamento aqui se liga à igualdade e ao Estado de Direito. As autoridades, na república, não são “sagradas” e “invioláveis”, como os reis nas monarquias. Portanto, não há, via de regra, razão para imunizá-las diante dos instrumentos de res- ponsabilização que atingem a todos os demais cidadãos. Como assentou o STF, em voto do Min. Celso de Mello, “a responsabilidade dos governantes tipifica-se como uma das pedras angulares essenciais à configuração mesma da ideia republicana”. 20 É certo que o próprio texto constitucional prevê, por vezes, exce- ções a esse princípio, criando certos temperamentos e exceções pontu- ais à responsabilização de determinadas autoridades. Nessas hipóteses, o princípio republicano impõe que se adote interpretação restritiva de tais exceções, que não devem exceder ao estritamente necessário à promoção das finalidades a que se destinam. Tal orientação foi adotada pelo STF em alguns casos importantes. Assim, o Supremo já decidiu, por exemplo, que a imunidade penal relativa concedida pelo art. 86, § 4º, da Constituição, segundo o qual “o Presidente da República, na vigência de seu mandato, não pode ser responsabilizado por atos estranhos ao exercício de suas funções” : (a) sendo norma excepcionalíssima, não 19 Nessa linha, a doutrina é farta: e.g., Geraldo Ataliba. República e Constituição. 2ª ed. São Paulo: Malheiros, 1998, p. 65-69; Enrique Ricardo Lewandowski. "Reflexões em torno do princípio republicano". Revista da Faculdade de Direito da Universida- de de São Paulo. V. 100, 2005, p. 193-194; Adriano Pilatti. "O Princípio Republicano na Constituição de 1988". In: Manoel Messias Peixinho, Isabela Franco Guerra e Firly Nascimento Filho (Orgs.). Princípios da Constituição de 1988. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2001, p. 129-136; Luís Roberto Barroso e Aline Osório. "O Supremo Tribunal Federal em 2017: a República que ainda não foi", p. 8-9, disponível em www.osconstitucionalistas.com.br/o-stf-em-2017-a-republica-que-ainda-nao-foi. 20 STF. ADI 978, Tribunal Pleno, Rel. Min. Celso de Mello, D.J. 17.11.95.

RkJQdWJsaXNoZXIy NTgyODMz