Revista da EMERJ - V. 20 - N. 3 - Setembro/Dezembro - 2018
R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 20, n. 3, p. 296 - 318, Setembro - Dezembro. 2018 301 um “horizonte de sentido”, a ser perseguido pelo Estado e pela sociedade brasileira. Portanto, tal princípio desafia classificações das normas cons- titucionais pelo seu objeto: e.g, “normas de organização”, “normas defini- doras de direitos” e “normas programáticas”. 13 O princípio republicano, como se verá, desempenha simultaneamente todos esses papéis. Tema instigante é o da estatura hierárquica do princípio republicano na Constituição de 88. Evidentemente, pela sua natureza constitucional, o princípio prevalece sobre as decisões de todos os poderes do Estado, ensejando a invalidade dos atos e normas que com ele não se compatibili- zem. Mas o que dizer das emendas constitucionais? O princípio é cláusula pétrea na Constituição de 88? Diferentemente do que ocorreu em outras Constituições brasilei- ras – as cartas de 1891, 1934, 1946, 1967 e 1969 –, a atual não inseriu a república no elenco das cláusulas pétreas (art. 60, § 4º, CF). Além disso, previu a realização de plebiscito em 1993, em que atribuiu ao povo a pos- sibilidade de optar pela forma monárquica de governo (art. 2º, ADCT). Por tal razão, entendo que, em si mesmo, o regime republicano não con- figura cláusula pétrea, mas que a sua eventual modificação dependeria de nova deliberação popular, por meio de outro plebiscito. 14 O Congresso, sem decisão popular direta, não poderia fazê-lo, nem mesmo por meio de emenda constitucional. Afinal, a decisão dos representantes do povo não pode se sobrepor à vontade do próprio povo, titular último da soberania. Porém, como em nossa ordem constitucional os direitos fundamen- tais representam limitações materiais ao poder de reforma (art. 60, § 4º, IV CF), há aspectos do regime republicano, como a igualdade, que não podem ser suprimidos nem mesmo por plebiscito. Ademais, considero o Estado Democrático de Direito uma cláusula pétrea implícita, que pode ser claramente inferida da inserção, no respectivo elenco, do “voto direto, secreto, universal e periódico” (art. 60, § 4º, II, CF). Daí porque tampouco me parece possível introduzir no Brasil, por qualquer procedimento, uma monarquia nos moldes tradicionais, em que o monarca detenha poderes políticos reais e significativos, já que tal regime está longe de ser demo- crático. Esse quadro, porém, não corresponde ao das monarquias consti- 13 Tal classificação, de grande penetração na academia brasileira, foi elaborada por Luís Roberto Barroso. Cf. Luís Rober- to Barroso. O Direito Constitucional e a efetividade de suas normas. 4ª ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2000, p. 93-120. 14 Tratei do tema em Cláudio Pereira de Souza Neto e Daniel Sarmento. Direito Constitucional: teoria, história e métodos de trabalho. 2ª ed. Belo Horizonte: Fórum, 2014, p. 318-319.
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